Exercício da psicanálise a serviço do paciente e não da psicanálise

por Luiz Alberto Py

Nos próximos artigos que pretendo publicar no Vya Estelar, apresentarei a forma de usar a psicanálise que desenvolvi ao longo de mais de quarenta anos de trabalho. Uma psicanálise que – entre outras coisas – está a serviço do analisando e não, como usualmente a vemos, a serviço da própria teoria psicanalítica. Vou tentar explicar o que quero dizer com isto:

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Há algum tempo fui procurado por um homem de quase setenta anos que se queixou de uma fobia que vinha se agravando recentemente. Tivemos uma rápida entrevista. Ele me impressionou por ter uma aparência bem mais jovem do que sua idade e um ar surpreendentemente saudável. Durante nossa conversa contou-me que se preocupava com sua saúde, alimentando-se com cuidado e fazendo exercícios físicos regularmente.

Fobia antiga

Explicou-me que sua fobia era muito antiga, desde garoto tinha certo desconforto com elevadores e sentia-se mal sentado no banco traseiro de carros. Uma ligeira claustrofobia, mas que nunca havia atrapalhado sua vida. Todavia, nos últimos tempos estava piorando, o que o preocupava. Insistiu que não queria tomar remédios, pois era contra ingerir drogas químicas só o fazendo em último caso. Perguntei se conseguia localizar quando havia ocorrido a piora na sua situação emocional e pelo que me contou pude perceber que havia uma correlação entre o aumento da fobia e um sentimento de estar envelhecendo e aproximando-se da morte.

Comentei com ele minha percepção e falamos um pouco da questão da inevitabilidade da morte e da consequente necessidade de nos prepararmos para aceitá-la, embora sem deixar de lutar contra ela. Foi uma conversa rápida, mas tive uma clara impressão de que eu lhe havia falado tudo o que ele precisava ouvir naquele momento. Disse-lhe, finalizando nossa conversa, que eu tinha a impressão de que sua fobia iria melhorar, provavelmente voltando aos níveis anteriores, que não chegavam a lhe incomodar. Deixei-o à vontade para me procurar caso sentisse necessidade, pedi que me desse notícias suas por telefone após algum tempo (deixei o tempo em aberto) e nos despedimos. A entrevista toda não chegou a uma hora.

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Dois meses depois ele telefonou para dizer que realmente tinha melhorado da fobia e havia aproveitado muito nossa conversa, volta e meia pensava no que comentáramos sobre a morte e estava se sentindo mais tranquilo e até trabalhando melhor. Mencionou um desejo de voltar a me procurar, acho que para garantir-se de que poderia eventualmente contar comigo. Insisti que estava à sua disposição e desligamos. Quase um ano depois voltou a marcar um encontro comigo para falar de alguns problemas na relação com sua mulher. Ao final da nossa conversa perguntei sobre a fobia. Sorriu e disse que isto não o incomodava mais. Desde então não voltei a vê-lo.

Psicanálise: cura em uma hora

Pouco tempo depois, contei esta história num curso para estudantes de psicanálise, para ilustrar a ideia de como podemos usar nossa experiência e sensibilidade de psicanalistas para ajudar as pessoas sem ter que submetê-las a um penoso processo de longas sessões, várias vezes por semana durante anos a fio. Ao iniciar a narrativa disse-lhes que ia contar a história de uma cura em uma hora. Quando terminei, perguntei que cura eu havia obtido. O palpite mais óbvio era de que eu tinha curado a claustrofobia de nosso amigo; alunos mais sutis sugeriram que eu o tinha curado do medo de morrer.

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– Nada disso – retruquei – eu o curei da necessidade de fazer psicanálise.

Continua…