Por uma série de condições culturais o ego ocupa um lugar de destaque no ambiente em que vivemos. Não apenas isso, mas ele também tende a ocupar dimensões cada vez maiores. Sua expansão contínua não é uma novidade e a tendência a que ele ocupe mais e mais espaço se faz perceptível por toda parte.
Geração mimimi
Não é raro que as gerações mais velhas percebam isso de maneira mais clara, uma vez que seu longo percurso de vida permite detectar essa mutação cultural de um ego em contínua expansão. Desse ponto de vista é normal que se acusem as novas gerações de excesso de sensibilidade, de uma disposição acentuada para se deixar afetar por qualquer coisa que não esteja de acordo com seus desejos. Daí aquelas conhecidas reclamações contra a geração mimimi.
Essas críticas são tão difundidas como ineficazes. Estamos diante de um processo cultural que ocupa todas as dimensões da existência das pessoas. Críticas racionais costumam ter pouco efeito sobre essas situações na medida em que o que está em questão é um conjunto de valores nos quais as pessoas se encontram imersas – como se fosse a atmosfera em que nos encontramos e que, inclusive, entra e sai de nós a cada respiração. Assim, acusar as pessoas de terem uma sensibilidade exagerada diante de situações existenciais não parece resultar em nada que não seja destacar as diferenças de percepção entre gerações diferentes.
Para os mais velhos sensibilidade dos jovens é exagerada
Para os mais velhos, essa sensibilidade exagerada parece fora de propósito e sem justificativas. Para os mais jovens, a avaliação parece pura falta de compreensão e empatia, além de alguma grosseria. Não reconhecer que as dores e sofrimentos dos mais jovens são autênticos deve soar mesmo como um gesto de insensibilidade e incapacidade de comunicação. A questão toda parece girar, então, em torno de uma incompreensão entre gerações que não pode se resolver por meio de um entendimento, já que se pensa a partir de pontos de vista distintos.
Dramas do ego são um exagero?
De fato, críticas a formas de comportamento culturais não possuem qualquer eficácia. Pode parecer de algum ponto de vista externo que os dramas do ego são um exagero, senão um dramalhão – sempre apelativo e de qualidade duvidosa. Somente uma compreensão interna dessa disposição para a hipersensibilidade pode conduzir a alguma possibilidade de diálogo entre a geração atual e uma anterior, para a qual a vida parecia sob outras cores. Os índices de depressão, suicídio, sentimento de falta de sentido existencial etc das gerações mais jovens não poderá ser revertido por meio da adoção de um estilo de vida vindo do passado.
Como diminuir o significado intenso do que é perturbador?
Claro que podemos perceber com certa facilidade que os dramas do ego poderiam se dissipar – pelo menos parte deles – se as pessoas não se dispusessem a prestar tanta atenção em si mesmas. Uma maneira de diluir o significado intenso de alguma coisa é colocá-la em uma perspectiva mais ampla. Assim, se os percalços da vida lhe parecem tão agressivos, se a dor é sua companheira contínua e você não vê saída em alguma situação em que se encontra, talvez baste perceber que há milhares e milhares de pessoas que já passaram por esse tipo de situação. Uma simples consideração estatística sobre a quantidade de seres humanos no planeta seria suficiente para diluir o sofrimento mais intenso, transformando-o em uma experiência conhecida e nada original. Desse ponto de vista você é só mais um.
A questão é que o ego, de dentro de sua perspectiva dramática, sempre pode afirmar o aspecto único e genuíno de seu sofrimento. Afinal, para ele nunca ninguém sofreu como ele, nunca alguém passou pela experiência da sua dor. O fato da dor ser sua faz toda a diferença para ele e o impede de assumir uma avaliação estatística sobre ela, aquela que lhe diz que ele é apenas mais um sofredor entre milhares de outros.
Aumento e diminuição
Assim, tudo indica que o ego continuará sua tendência de valorização crescente de suas experiências, de ampliação do seu círculo de valores sobre todas as dimensões da vida e que, portanto, as dificuldades de comunicação entre as gerações tendem a aumentar. O que importa saber é até que ponto essa curva se ampliará e qual será o momento em que ela começará a refluir diante de tudo o que nos cerca. Afinal, a ampliação dos dramas do ego é também a diminuição da importância de tudo o que não somos nós.