Insulina: quando o excesso de comida desequilibra o metabolismo

Insulina: sua função é regular o nível da glicose no sangue. O metabolismo da glicose é desencadeado pela ingestão de alimentos que, após sua digestão, elevam o nível de açúcar no sangue.

Insulina é um hormônio composto por 51 aminoácidos, secretado pelas células β do pâncreas. A insulina desempenha papéis importantes na homeostase (estado de equilibro) da glicose, crescimento celular e metabolismo geral.

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A descoberta da insulina há 100 anos, em 1921, também levou ao achado de outro hormônio pancreático, o glucagon. A insulina interage com glucagon para modular o teor de glicose no sangue – insulina age por via anabólica, enquanto glucagon executa funções catabólicas. A insulina regula os níveis de glicose através do seu armazenamento no fígado, músculos e tecido adiposo, podendo resultar em ganho geral de peso se houver um excesso de oferta de glicose (açúcar, carboidratos simples). A modulação de uma ampla gama de sistemas fisiológicos pela insulina torna sua síntese e níveis sanguíneos cruciais no início e na progressão de várias doenças crônicas.

As múltiplas funções da insulina

A mais conhecida função da insulina é a regulação da glicose. O metabolismo da glicose é desencadeado pela ingestão de alimentos que, após a digestão, elevam o açúcar no sangue. Para levar os níveis de glicose sanguínea de volta ao normal (70 a 100 mg/dl) há aumento simultâneo da produção de insulina e diminuição da secreção de glucagon. Após ser liberada, a insulina circula e chega às células do fígado, e estas armazenam a glicose excedente em forma de glicogênio. Células musculares esqueléticas e células de gordura são os outros principais alvos da insulina circulante, e também captam a glicose reduzindo o nível no sangue para a linha basal – da normalidade.

Síntese de proteína, glicogênese e lipogênese

A insulina desencadeia a absorção de glicose, síntese de proteína muscular esquelética, glicogênese (síntese de glicogênio) e lipogênese (síntese de ácidos graxos e triglicerídeos) através de receptores. Estes receptores são ativados e ‘acordam’ várias proteínas intracelulares que, por sua vez, regulam as atividades metabólicas da insulina, como crescimento celular e expressão genética. Na deficiência de insulina é impossível para as células usar a glicose como fonte de energia, e assim a concentração no sangue se eleva. A hiperglicemia (elevado nível de glicose no sangue) prolongada leva ao diabetes tipo 2 e pode causar várias complicações de saúde, como danos no sistema nervoso, circulatório, renal.

Ações da insulina no corpo

A insulina regula o fornecimento de energia para o corpo

A principal ação da insulina é regular o fornecimento de energia ao corpo equilibrando os níveis de micronutrientes após a ingestão de alimentos. Insulina é fundamental para o transporte de glicose para células/tecidos dependentes deste hormônio, como fígado, músculo e tecido adiposo.

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A insulina regula a glicemia dependendo de jejum, alimentação, atividades diárias, trabalho físico e mental: para cima através da utilização veloz da glicose armazenada no fígado, para baixo pela absorção acelerada de glicose circulante pelo tecido adiposo e músculo esquelético. Ela ajuda no ganho de massa muscular e, infelizmente, também no ganho de massa gorda.

Insulina e fígado

O fígado é o órgão primário da ação da insulina. Entre as muitas funções da insulina está o equilíbrio da glicemia. Ou seja, sintetizando glicogênio a partir da glicose e convertendo o excedente em ácidos graxos e triglicerídeos. Por isso, o consumo excessivo de carboidratos pode levar ao acúmulo de gordura no fígado (esteatose hepática).

Insulina e músculos

O músculo esquelético é um dos tecidos mais dinâmicos do corpo humano, e representa quase metade do peso corporal. Cerca de 70% da glicose é usada pelo tecido muscular: a hiperglicemia após uma refeição incentiva o pâncreas a secretar insulina, comandando a absorção e a utilização da glicose pelos músculos.

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Insulina e tecido adiposo

O organismo precisa de energia para sobreviver e evoluiu para armazenar energia extra quando há abundância de alimentos. Trata-se de uma importante adaptação fisiológica que aumenta as chances de sobrevivência durante os tempos de fome.

A insulina faz as células adiposas armazenarem energia extra (calorias) em forma de gordura. É interessante notar que o tecido adiposo (que armazena gordura) é encontrado em todas as partes do corpo. Qualquer desequilíbrio no fornecimento de energia (comida) resulta na quebra de gorduras armazenadas no tecido adiposo, por isso emagrecemos quando comemos pouco.

O que é resistência à insulina?

Resistência insulínica define a perda da capacidade das células do corpo de responder ao comando da insulina. Apesar de haver um nível suficiente de insulina, as células do fígado, músculos e tecido adiposo não conseguem absorver a glicose que circula no sangue. Assim, a glicemia se eleva além do valor normal, resultando em efeitos adversos à saúde. A resistência à insulina causa aumento de triglicerídios (um tipo de gordura composta por três moléculas de glicose) na corrente sanguínea, alterando ainda mais a sensibilidade à insulina.

Porta, fechadura e chave

Podemos pensar na resistência à insulina com uma analogia de porta, fechadura e chave. A glicose circulando no sangue está tentando passar pela ‘porta’, representada pela membrana que envolve as células. Em cada uma dessas células temos ‘fechaduras’, os receptores celulares. Para entrar nas células, a glicose precisa da ‘chave’ para abrir a porta – insulina é a chave. Quando as chaves e fechaduras estão funcionando bem, as portas se abrem, a glicose entra nas células e os níveis no sangue ficam normais. Quando temos a chave (insulina), mas o buraco da fechadura está bloqueado, a chave não funciona e a glicose não consegue entrar – aí temos a resistência insulínica. Há insulina disponível, mas ela não é capaz de abrir a porta porque os receptores celulares não estão receptivos.

Excesso de comida

Neste caso, o pâncreas precisa fazer hora extra e secretar mais insulina para compensar o problema, assim os níveis de insulina em jejum permanecem elevados, caracterizando o diagnóstico de resistência insulínica – muita insulina circulando no sangue.

Alguns fatores podem prejudicar a sensibilidade à insulina, porém uma superalimentação contínua, ou seja, comer muito mais do que o organismo precisa, cria um ciclo vicioso de hiperinsulinemia e resistência à insulina, que culmina em eventual falha das células β do pâncreas, levando ao diabetes tipo 2.

Problema evolutivo

Todos os seres vivos precisam comer. Essa característica representou um grande desafio durante o período evolucionário, através das eras. As fontes de nutrientes eram escassas e as demandas calóricas mudavam constantemente (clima, caçadas, deslocamentos por grandes distâncias). Os animais, incluindo a raça humana, resolveram esse problema desenvolvendo mecanismos para promover o anabolismo (armazenamento de energia) quando o fornecimento de calorias excedia as necessidades, e facilmente se tornavam catabólicos (uso da energia estocada) quando as demandas não podiam ser atendidas com a alimentação.

Abundância X escassez

Na época de ‘vacas gordas’ o ser humano armazenava gordura corporal; no tempo de ‘vacas magras’ essa gordura era queimada para fornecer energia. A secreção e ação da insulina permitiam uma solução para este problema central (muita comida X pouca comida). Após o consumo de alimentos, a insulina promove a absorção de carboidratos nos principais locais de armazenamento (fígado, músculos e tecido adiposo) e converte carboidratos e proteínas em lipídios, permitindo um estoque mais eficiente de calorias – isso pode significar ganho de peso.

Resistência insulínica, obesidade e doenças modernas

Embora essa capacidade de armazenar energia dietética para tempos difíceis tenha apoiado o desenvolvimento da vida animal por milhões de anos, ela recentemente deu errado para os seres humanos. Em um tempo notavelmente curto, alteramos um ambiente de escassez calórica e alta demanda de energia para outro com abundante oferta calórica e pouca demanda de energia.

No mundo atual a obesidade é endêmica e as sociedades estão lutando contra a crescente prevalência de doenças associadas à obesidade, como síndrome metabólica, fígado gorduroso, diabetes, doenças cardíacas. A resistência à insulina é a razão principal para muitas das doenças modernas.

Referências
*Int. J. Molecular Science 2021. Role of Insulin in Health & Disease: An Update.
*Diabetologia 2020. The making of insulin in health & disease.
*J Clinical Investigation 2021. Insulin signaling in health & disease.
*Physiology Reviews 2018. Mechanisms of Insulin Action & Insulin Resistance.
*J Res Medical Science 2021. Skin & metabolic syndrome: A review of the possible associations.
*Int J Molecular Science 2021. Role of Insulin Resistance in MAFLD.
*Nutrition, Metabolism & Cardiovascular Diseases 2019. Carbohydrate intake & risk of metabolic syndrome: A dose-response meta-analysis.

Médica especializada em Nutrologia. Membro da ABRAN – Associação Brasileira de Nutrologia. Pós-graduada em Terapia Ortomolecular, Nutrição Celular e Longevidade – FACIS-IBEHE Faculdade de Ciências da Saúde de São Paulo e Centro de Ensino Superior de Homeopatia. Membro Titular da Sociedade Médica Brasileira de Intradermoterapia. Consultora com atuação em Nutrologia e Medicina Ortomolecular. CRM 52 301716 www.tamaramazaracki.med.br