Isolamento covid: ficar muito tempo longe de quem amamos diminui o afeto?

Isolamento covid: nada substitui o calor do abraço e do beijo das pessoas que amamos. Houve prejuízos nas relações interpessoais em diversas faixas etárias e em outros âmbitos; entenda  

Sem dúvida a pandemia impactou fortemente a vida das pessoas de todas as idades. No mês de março do ano passado, recebemos a imposição do isolamento social e das medidas sanitárias necessárias frente à Covid-19. Foi proposta uma quarentena, mas, passado esse período, os adiamentos para a volta à normalidade ou para o chamado “novo normal” foram se sucedendo, um após o outro e cá estamos, depois de quase um ano e meio, vivendo ainda sob a pandemia sem perspectivas boas seguras.

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Isolamento covid: prejuízos

Depois de todos esses meses, verifica-se prejuízos importantes na vida de quase todas as pessoas. Entre os bebês que nasceram na pandemia, poucos saíram de suas casas e muitos não conheceram os membros da família extensa.

O Brasil foi um dos países onde os períodos de fechamento das escolas ficaram entre os mais longos do mundo. Isso trouxe um prejuízo considerável aos alunos em geral. As crianças na primeira infância não foram, ou pouco foram, à escola, perdendo a oportunidade de interagirem com colegas e professores, de serem estimuladas à sociabilidade. Este fator é necessário ao desenvolvimento emocional. Assim, permaneceram nas suas casas, e por mais estimuladores que tenham sido os pais, muitas dessas crianças apresentam hoje comportamentos regredidos, próprios de idades anteriores.

Isolamento na covid trouxe prejuízos à segunda infância

A maioria das crianças na segunda infância, na fase escolar, que teve o aprendizado deslocado para as telas eletrônicas, enfrentou problemas com a adaptação às novas ferramentas e teve o aprendizado bastante prejudicado por ser à distância. Sabe-se que a atualização do potencial intelectual está intrinsecamente ligado às experiências da vida e, nessa fase da vida, ao aprendizado junto aos colegas e professores diário e constante.

Afastados de colegas, amigos e professores, um número significativo de pré-adolescentes e de adolescentes também mostram hoje comprometimentos importantes quanto ao desenvolvimento cognitivo e emocional. Perderam a rotina e a disciplina escolar e se desorganizaram. Perderam o convívio dos amigos e se apegaram ao mundo virtual.

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Prejuízos para os adultos jovens

O ensino superior continua à distância. Existem adultos jovens que estão frequentando os primeiros três semestres da faculdade, sem nunca ter sequer pisado no prédio da instituição. Jovens recém-formados estão com dificuldade para conseguir ingressar no mercado de trabalho.

As escolas, consideradas “serviço essencial” reabriram, mas a maioria com aulas presenciais reduzidas e com uma complementação grande, online. Assim, as pessoas da família nuclear continuam, na prática, habitando o mesmo espaço físico – a sua casa.

Conflitos familiares no isolamento social

Há mais de um ano, cogitava-se que o convívio forçado, imposto pelo isolamento social, favoreceria a aproximação afetiva entre as pessoas da família que viviam na mesma casa. Pais se aproximaram mais de seus filhos, mas nem sempre essa aproximação foi tranquila, pois as pressões e cobranças determinaram discussões e brigas contínuas. Casais passaram a conviver vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana, mas, para muitos, o convívio tão intenso gerou conflitos e muitas separações ocorreram.

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A falta do espaço da falta

Na família nuclear, passar o tempo todo junto, parece ter prejudicado as relações interpessoais pela falta do espaço da falta. Entretanto, no que se refere à família extensa, o afastamento dos avós, bisavós, tios e primos trouxe a outra contraparte. Ainda que os vínculos familiares bons independam da proximidade constante e que o afeto possa subsistir na ausência física do parente querido, nada substitui o calor do abraço e do beijo das pessoas que amamos.

O pior é que muitas pessoas mais velhas foram afastadas e segregadas às suas casas, longe do convívio de filhos e netos. As justificativas para isso foram de ordens diferentes. Pelo menos antes da vacina, a segregação era explicada pelo risco que as pessoas jovens traziam às mais velhas. Agora, no momento pós-vacina, muitos idosos continuam sozinhos. Será que o isolamento social vivido previamente, passou a determinar uma nova forma de relacionamento nas famílias? O tempo nos dirá.

É psicóloga especializada em psicoterapia de crianças e adolescentes. Mestre em psicologia clínica pela PUC-SP, Doutora em Distúrbios da Comunicação Humana pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo, professora do Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica da PUC e autora de vários livros, entre eles 'Pais que educam - Uma aventura inesquecível' Editora Gente.