Limites na educação das crianças

Convivemos hoje com um aumento crescente de crianças que não admitem ser contrariadas, que não aceitam o “não”, que não sabem lidar com qualquer frustração

Coitadas das crianças! Elas ignoram os custos e efeitos da ditadura dos filhos, das consequências futuras da ignorância de pais e mães inaptos e ineptos. Antônio Carlos Aquino de Oliveira

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Um dos temas mais frequentes sobre os quais escrevi nessa coluna, foi sobre a necessidade de limites na educação de crianças. Hoje, mais do que nunca, é importante ressaltar a importância de normas adequadas, de regras protetoras e da disciplina necessária na educação das crianças e discutir também sobre princípios e valores, aos quais elas estão relacionadas.

No desenvolvimento humano, é sabido que o controle sobre os impulsos, a regulação das emoções, a aquisição da capacidade para entreter tensão interna e para tolerar frustração é o que nos faz humanos, diferentes dos animais. Essas aquisições são padrões relacionados à evolução do homo sapiens-sapiens, do homem que sabe que sabe e que reflete sobre o que pensa.

Crianças ditadoras: não admitem ser contrariadas 

Convivemos hoje com um aumento crescente de crianças que não admitem ser contrariadas, que não aceitam o “não”, que não sabem lidar com qualquer frustração, que não aceitam comandos, que não sabem levar em consideração os direitos dos outros. Onipotentes, prepotentes, são crianças que acreditam que elas mandam em casa e fora dela, considerando os adultos meros serviçais.

Muitas vezes, a escola pode se tornar para essas crianças, um ambiente de continência, contenção e segurança. As regras são claras e as expectativas em relação à adaptação acadêmica e social do aluno são explicitadas continuamente. Existe uma hierarquia e as figuras de autoridade se colocam com firmeza. Em relação aos colegas, o aluno aprende a discriminar as situações, nas quais pode se afirmar e, nas quais deve ceder, para não correr o risco de ser marginalizado.  Dessa forma, o ambiente escolar, com frequência, pode se tornar terapêutico para a criança proveniente de um ambiente familiar permissivo demais.

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Outras vezes, mesmo na escola, a criança não consegue se adaptar, repetindo a mesma conduta da casa, na classe. Do mesmo modo que não respeita os pais, não respeita os professores. Ela não faz o que eles pedem, não se interessa pelo aprendizado, recusa-se a colaborar com quaisquer que sejam as demandas. Em relação aos colegas, o padrão, que mais frequentemente se observa, é a agressão maldosa ao outro, podendo essa criança se tornar o líder de situações de bullying

Observa-se um aumento importante no número de crianças que não estão sendo adequadamente criadas e educadas e que estão se transformando em seres não civilizados, vazios de experiências amorosas, que não sabem o que é solidariedade, companheirismo e que não se capacitam para trocas afetivas e nem mesmo cognitivas. O risco maior ainda é a progressão para os transtornos de oposição e  desafio, para os transtornos de conduta, para a delinquência e para as sociopatias a seguir. Tem-se instalado um filiarcardo, a ditadura dos filhos.

Por que a hierarquia é importante no convívio familiar 

Desobediência crônica nas famílias gera bebês-gigantes, adultos desorientados

Na orientação aos pais, costumo explicar que família não é propriamente uma democracia. Ainda que os tempos tenham mudado muito, ainda é importante uma hierarquia: pais que mandem e crianças que obedeçam – isso para a própria segurança e bem-estar delas.

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O termo obediência tem origem no latim odoedire, significando escutar com atenção. É considerada uma das virtudes e se define como um comportamento pelo qual a pessoa aceita ordens dadas por outro. Obedecer quer dizer subordinação da vontade à uma autoridade. Significa também, a escuta atenta para acatamento à uma instrução, comprimento de um pedido ou abstenção de algo que é proibido.

Isso é o que mostra o dicionário. Mas obedecer, nos tempos atuais, infelizmente é uma virtude desprezada. A sociedade contemporânea, tida como neonarcisista, individualista e hedonista privilegia o espaço e os direitos da pessoa em detrimento do espaço e direitos alheios e confunde desobediência, oposição, negativismo, birra e falta de educação com afirmação e autonomia.

Existem muitas crianças mal-educadas, malcriadas que não atendem às solicitações dos pais, que não respeitam os outros, que não foram ensinadas a viver em comunidade e que incomodam as outras pessoas. E existem mães que justificam o comportamento inadequado e abusado do filho, exigindo que as outras pessoas cedam aos desejos dele.  Falta a elas a autocrítica.   As crianças que não foram ensinadas a obedecer, têm pais que não se colocam como figuras de autoridade frente aos seus filhos e, portanto, não são respeitáveis. A desobediência crônica nas famílias gera bebês-gigantes, que são os adultos desorientados, perdidos e pouco eficientes nas atribuições que lhes são destinadas e pobres do ponto de vista do seu desenvolvimento psicológico, tão frequentes nos nossos tempos.

É psicóloga especializada em psicoterapia de crianças e adolescentes. Mestre em psicologia clínica pela PUC-SP, Doutora em Distúrbios da Comunicação Humana pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo, professora do Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica da PUC e autora de vários livros, entre eles 'Pais que educam - Uma aventura inesquecível' Editora Gente.