por Dulce Magalhães
Apesar das dezenas de possibilidades que estão ao nosso redor, da riqueza de recursos naturais de nosso país, do avanço tecnológico que já alcançamos… só existem dois recursos que podem alavancar o progresso em nossas carreiras e, conseqüentemente, nas organizações.
Esses recursos são complementares, mas têm formatos opostos. Um deles é limitado, escasso, não renovável, portanto precisa ser gerenciado de maneira bastante profissional; ser administrado a conta-gotas para que não haja nenhum desperdício. Esse recurso tão precioso e raro é o TEMPO.
Já o outro recurso que possuímos é abundante, renovável, ilimitado. Muito provavelmente vamos terminar nossas vidas sem conseguir usar sequer a metade de seu potencial, mesmo que estejamos utilizando-o sem descanso. Os recursos abundantes são os NEURÔNIOS, a capacidade de aprender, de criar, de gerar soluções inovadoras. Esses dois recursos são a base e a medida de nosso potencial. A boa gestão desses recursos faz com que sejamos eficazes: a isso se dá o nome de talento. A aplicação constante do talento resulta no que costumamos chamar de sucesso.
Sendo assim a administração do tempo e dos neurônios é a razão direta e a medida justa de nosso sucesso. Cabe-nos, portanto, sermos especialistas na gestão desses recursos. Aqui começa nosso desafio de mudança.
Considerando o tempo um bem de característica tão fugaz, seria lógico pensarmos que o uso econômico e adequado é uma prática frequente, entretanto não é o que acontece. O primeiro erro que se comete é não percebê-lo como um recurso escasso. Acreditamos que sempre teremos tempo suficiente para realizarmos tudo o que desejamos. Desperdiçamos nosso precioso tempo, como se fosse ilimitado. Jogamos tempo fora, um pecado… Há dias (como estamos inconscientes!) que desejamos que o tempo passe mais rápido. Rezamos para que a semana acabe. Sendo um bem tão perecível, não deveríamos jamais perder um minuto sequer, contudo atiramos pela janela de nossos dias o valioso tempo que pode nos levar a alcançar todo o sucesso que almejamos.
Ideias aumentam a capacidade de gerar ideias
O paradoxal é saber que com os neurônios, um recurso tão abundante, ocorre justamente o oposto. Economizamos ideias, mantemos durante anos as mesmas rotinas, temos dificuldade de alterar métodos, nos aprisionamos a hábitos antigos. A capacidade que temos de gerar ideias e de desenvolver soluções é limitada por nossos padrões atuais. Contudo, podemos desperdiçar ideias à vontade, ter ideias inúteis, jogar ideias fora, sem medo, sempre há chances de se ter mais e mais. Aliás, o que mais impressiona nesse recurso é que quanto mais ativamos nossos neurônios através de aprendizagem, da sintonia com o mundo à nossa volta, com reflexões sobre causa e consequência, quanto mais ideias temos, maior a nossa capacidade de gerar ideias.
Os neurônios são um recurso fabuloso. Podem, inclusive, maximizar o uso do recurso tempo. Podem transformar todos os nossos resultados, abrir oportunidades, apontar caminhos, gerar soluções inusitadas. Na maioria das vezes, nem sequer utilizamos esse vasto recurso. Esperamos que o tempo (escasso) resolva todos os problemas, e deixamos os neurônios (abundante) fora de ação.
Mercado paga pelo tempo, mas não paga por uma ideia extra
Um reflexo disso é a forma como o mercado comercializa esses recursos. As organizações nos contratam por causa de nosso recurso neurônios, entretanto administram nosso recurso tempo. Querem saber a que horas nós chegamos, verificam a que horas saímos, estão focadas na quantidade de horas que lhes vendemos por semana. Chegam a pagar por horas extras que possamos lhes oferecer, mas muito raramente, recompensam nossas ideias, dificilmente mensuram nosso uso de neurônios, jamais remuneram por ideias extras.
Nessa prática de ponta cabeça do mercado, vendemos nossa escassez, o tempo, e economizamos nossa abundância, os neurônios. Marcamos com as organizações um compromisso ditado pelo relógio, não pelo projeto. Trabalhamos pelo número de horas, não por empreitada. Temos datas, horários e prazos em nosso compromisso de trabalho, todavia se não tivermos ideias originais, não inventarmos nenhum método extraordinário, nem gerarmos soluções nunca pensadas antes, não tem nenhum problema. Na maioria das vezes ninguém espera que você entregue em neurônios o valor que recebe como remuneração. Mas todo mundo vai ficar preocupado se você chegar uma hora mais tarde, ou se não voltar do almoço numa terça-feira chuvosa de inverno. Vão descontar de seu salário o tempo que você não entregou à empresa, mas não passa pela cabeça de ninguém, suprimir seu salário, se no mês você não gerou nenhuma ideia nova.
Tempo não deveria ser vendido
O pior de tudo é perceber o quanto estamos mergulhados nesse modelo. Inconscientes do valor dos recursos que possuímos. Não deveríamos jamais vender nosso tempo, sendo ele um recurso tão raro. Deveríamos estar preservando nosso tempo de maneira inteligente. Administrando cada momento, decidindo o que tem valor, o que faz diferença, o que deve ser realizado aqui e agora. Escolhendo como viver cada minuto, fazendo a coisa certa de acordo com os nossos propósitos de vida. Deveríamos, sim, vender nossos neurônios, ofertar ao mercado ideias criativas. Produzir soluções sob medida, com padrões globais de qualidade, num sistema just in time. Para que devemos entregar um mês inteiro de nosso tempo, para gerar uma única ideia válida, produzida em apenas meia hora? O foco está errado.
Não temos tanto tempo assim para vender ao mercado. Há sempre um sem-número de coisas que queremos realizar, aprender, desenvolver, desfrutar, mas nunca há tempo suficiente. O que é contraditório, pois é um fato por todos conhecido, que não utilizamos 100% de nosso tempo nas organizações de forma produtiva. E é claro, também, que às organizações interessa muito mais os neurônios do que o tempo de seus colaboradores. São os neurônios que podem render resultados, alcançar metas, produzir com qualidade, gerar lucros. É a soma dos neurônios atuantes de uma organização que dá valor à marca e cria as possibilidades futuras. Não importa quanto tempo as pessoas entregam a uma empresa, mas sim a utilização eficaz dos neurônios durante esse tempo.
É preciso que a organização desenvolva um novo modelo de relacionamento profissional, baseado no uso dos neurônios, focado em resultados. Há empresas falindo por falta de ideias, mas gastando milhões na compra do tempo de seus funcionários. Na outra ponta há pessoas entregando valioso tempo em troca de pouco. Essa negociação é do tipo perde-perde. Devemos entregar neurônios, que é abundante para nós e valioso para a empresa e economizar tempo, valioso para nós e irrelevante para a organização.
Experiências bem-sucedidas
Vemos algumas raras, porém bem-sucedidas, experiências desse tipo. Horários flexíveis, contratação por tarefa, times mobilizados por projetos, equipes virtuais, trabalho em casa, reuniões online, foco em desempenho, remuneração por resultados. É uma nova realidade que vai rompendo a frágil estrutura onde estão baseadas as atuais relações de trabalho. Num ambiente em que bastava ter uma boa ideia de vez em quando para permanecer no mercado, era permitido que se desperdiçasse tempo. Numa situação de concorrência feroz, onde globalizamos soluções no decorrer de segundos e geramos expectativas com o apertar de uma tecla, agilidade é palavra chave; tempo é um recurso cada vez mais escasso e ideias são o diferencial competitivo. Nesse novo ambiente as organizações precisam estar preparadas para contratar neurônios e romper o paradigma ineficaz de gerenciar o tempo de seus colaboradores.
É uma grande mudança essa que estou propondo. Mas não há alternativa. Quanto pode durar o atual sistema organizacional? Quanto valor trará aos acionistas a boa gestão do tempo de seus colaboradores? Quanto resultado pode-se alcançar com um excelente cartão ponto? Hoje vemos pessoas que presidem associações, são síndicas em seus condomínios, lideram programas comunitários, tendo que apresentar justificativas por se ausentarem um dia do trabalho, atestados que garantam que só faltaram por doença, documentos que atestem onde utilizaram o tempo contratado pela empresa, independente de quanto valor podem estar agregando ao seu recurso neurônios.
Pode parecer estranho, mas ser feliz hoje representa um grande diferencial competitivo dentro desse novo paradigma. Pessoas felizes aprendem melhor, tê ideias, geram mais soluções. Contrate pessoas para que sejam felizes, permita que usem o tempo da forma que desejarem, concentre-se em administrar as ideias geradas, de forma a multiplicar seus efeitos. Contrate tempo e terá pessoas à sua disposição, contrate neurônios e terá superação de metas e conquista de resultados.