por Rosa Fonseca
Três horas dentro do carro. Não que geralmente fosse rápido. Uma hora, uma e meia, duas… Mas três? Repasso mentalmente o menu do meu dia: um pão de queijo e uns vinte cafés. Com o corre-corre, não parei para almoçar. A fome aperta. Esqueci de beber água. Que sede… Dedilho o celular para matar o tempo.
– Pizzaria, boa noite.
– Quero fazer um pedido. Meia pizza de mussarela com rúcula e meia de atum sem cebola. E um refri de 600ml, bem gelado.
– Pois não. Qual é endereço?
– É Av. Faria Lima, nº 1300. Estou num Uno vermelho, placa GBN 1405.
É um absurdo, eu sei. Me refiro a não conseguir almoçar. Mas não é assim que vivemos? Já acordamos cansados e atrasados. Não dá tempo para tomar um café da manhã digno. Trabalhamos como loucos, cada vez mais, mais tempo, sob maior pressão. Almoçar decentemente é um luxo. Que importa que se ganhe ticket, que o “por kilo” seja rápido, que o restaurante fique do lado do trabalho e que se tenha direito a uma hora inteirinha de intervalo assegurada por força de lei, se há outras forças em sentido contrário?
Que se dirá do jantar? Se você mora com uma mãe ou esposa à moda antiga talvez não perceba, mas jantar é o ápice do luxo. Quem aguenta acordar todo dia de madrugada para fazer o café, se arrumar, arrumar as crianças, levá-las na creche, labutar 12 horas seguidas sob estresse, encarar o trânsito caótico, arrumar a casa, fazer um jantar fresquinho, gostoso e nutritivo e depois ver a lição dos filhos, lavar e passar? Mulheres vivem dizendo que, se fosse só por elas, iam pra cama com fome mesmo. Não é força de expressão. É força do cansaço.
O que é mais insano: Pedir delivery no carro? Saber que possivelmente ficaremos parados tempo suficiente para a pizza chegar? Nosso estilo de vida?
Não sei o quanto resistiremos. É paradoxal as empresas falarem tanto de sustentabilidade e adotarem sistemas de produção improdutivos e insustentáveis. O dilema dos nossos tempos não é só o que vamos deixar às futuras gerações. É: Haverá futuras gerações? Quem vai chegar à maturidade sem problemas cardíacos, alimentares, reprodutivos, respiratórios, psiquiátricos? Quem tem tempo para ser mãe?
Desafio você a lembrar que o comeu nos últimos dias e encaixar na pirâmide alimentar. Pode ser vergonhoso, triste, revoltante, preocupante. Por força das pressões estéticas, achamos tempos para malhar, tomar pílulas, passar cremes. Fazemos regimes malucos. Mas quem dedica uma hora do seu dia à alimentação? Uma única horinha…
Não precisamos tanto assim de um computador novo, do último celular, da TV grande, de morar nesse ou naquele lugar, de sentar nesse ou naquele carro. Mas precisamos viver. Precisamos comer, comer decentemente. Não posso fazer escolhas por você. Mas posso afirmar que sempre, digo SEMPRE, é possível escolher. Por favor, escolha dar prioridade ao que é mesmo prioritário.
Se não conseguir abrir mão de nada para ter mais tempo, saiba que quanto menos tempo tiver, mais precisará se planejar para dar conta de tudo. Alimentar-se tem que entrar na lista de prioridades. Só tem um jeito de conseguir isso: planejando. Conheço quem reserve meia hora da sua agenda diária para checar o e-mail e as redes sociais, mas deixa a alimentação a cargo do acaso. São escolhas…
Para ajudar a dar certa ordem no caos alimentar, seguem algumas dicas:
• Colaboração é fundamental – todo mundo com mais de 11 anos, independente do sexo, precisa cozinhar. Aprendemos a usar o Windows, solucionamos logaritmos. Qual é a dificuldade em fazer uma salada, sopa ou omelete? As mulheres aprenderam a dirigir e trabalhar, certo? Os homens podem perfeitamente fazer um macarrão. Os adolescentes querem crescer rápido e ser mais independentes, certo? Pois que saibam alimentar-se por si, caso precisem. Está cheio de cursos de culinária rápidos e divertidos por aí, receitas, programas de culinária e avós prontas a ensinar. É cruel deixar a responsabilidade da alimentação familiar recair sobre um único ser humano. Todos devem fazer algo. Sugiro adotar uma escala para o fogão por dias da semana, incentivar as crianças a arrumar a mesa e designar quem não cozinhou para lavar a louça. Sem dramas.
• Planeje a semana – como legado dos tempos de inflação, nós, brasileiros, adotamos o hábito das compras do mês. A dinâmica da vida atual é tão diferente da época de nossas mães, mas continuamos comprando do mesmo jeito, as mesmas coisas… Quem tem feijão estocado, mas nunca tem tempo para fazer? Quem joga pilhas de hortifruti no lixo porque não consegue comer a tempo? Tem a despensa ou o freezer entupidos, mas nunca tem nada bom disponível na geladeira? Sugiro fazer compras semanais, buscando alimentos mais frescos, prontos para serem consumidos. Combine com a família os pratos que serão feitos na semana e adquira o necessário para esse período.
• Vá à feira – se puder, troque o mercado pela feira, sacolão ou hortifruti. Você e sua família encontrarão coisas muito mais fáceis de fazer. Não importa o que diga a propaganda de lasanha. Quanto tempo levar para preparar uma maçã? Refeições com legumes costumam ser as mais ligeiras e simples de aprontar. Nos supermercados, frutas e vegetais são tão insípidas e as comidas prontas tão atrativas, que acabamos enchendo o carrinho de biscoito. Fuja o quanto puder. Você comerá mais rápido, mais saudável, mais light, mais saboroso – e mais barato. Além do mais, ir ao mercado é tarefa chata para a maioria das pessoas. Mas levar a família para comer pastel com suco na feira livre pode ser um programão e ainda resolve o almoço de sábado.
• Use a conveniência que puder – vegetais descascados, frutas picadas, couves fatiadas, folhas pré-lavadas, alho amassado, cebola e ervas picadas, alimentos pré-cozidos, sucos prontos… São inúmeras as facilidades à mão. Mas foque nas comidas naturais. Por mais práticos que pareçam, sopa e suco de pozinho nem deveriam ser chamados de comida. E use o freezer! Tenho um amigo que compra comida caseira prontinha na rotisserie todo o sábado e congela para a semana. Treine sua faxineira para cozinhar – um arroz branco prontinho já ajuda. Quem puder contar com a força da mãe, sogra, avó ou tia, por que não? Use todas as ferramentas que puder para facilitar a vida. E não apenas miojo, lasanha congelada e disque-pizza. A saúde agradece.
• Não esqueça dos mata-fome – não paramos para almoçar, quiçá para lanchar. Não se engane: por mais que não queira beliscar ao longo do dia, isso vai acontecer. E é bom que aconteça, desde que os beliscos sejam apropriados. Ninguém deve matar a fome à base de chocolate e café. Abasteça-se na feira de castanhas, frutas frescas e secas, biscoitos integrais, caixinhas de suco, iogurtes… Planeje 1 a 2 lanchinhos por dia da semana, por membro da família, e adote o hábito de colocá-los diariamente sobre o prato do café da manhã, para que não sejam esquecidos.
• Informação é poder – subestimei a importância de aprender nutrição até estudar o tema na faculdade. A vida fica fácil quando você finalmente sabe o que comer. Busque informação confiável e objetiva e leia! Conhecimentos em culinária rápida também mudam a vida de uma pessoa. Xerete livros de receitas, pergunte e procure em sites, concentrando sua pesquisa no tempo de preparo máximo de 15 minutos. Você ficará surpreso com quantas milhões de maravilhas podem ser feitas nesse tempo.
• Sente, cheire, mastigue, relaxe – para quê tanto planejamento e disciplina, para engolir a comida absorto com o trabalho ou ante à TV? Não seria melhor trocar comida por soro na veia? Comer exclusivamente para se manter vivo é algo triste. Fazendo-o com sabedoria, é saudável recompensar-se com comida. Você trabalhou o dia todo, ficou no maior engarrafamento, cumpriu com 1001 obrigações… agora relaxe a aproveite a refeição. Bom apetite.