por Fátima Fontes
Introdução:
“… em nenhum lugar alguém se sente tão solitário e abandonado como precisamente na multidão da cidade grande”
(Georg Simmel, As Grandes Cidades e a Vida do Espírito, 1909.
Mais uma vez estamos juntos nesta trajetória reflexiva através de nossa vida e nossos vínculos em um mundo tão globalizado e complexo.
Queremos mais uma vez caminhar na direção de diminuir a nossa solidão como cidadãos de grandes cidades (como já era a Berlim descrita pelo sociólogo alemão Georg Simmel, nos anos de 1900, como colocado na epígrafe acima), e para isso nos uniremos neste texto.
Aproveito nosso recém-saído clima de fim de Olimpíadas, para centrar nossa reflexão na vitória coletiva de nosso medalhista de ouro: Arthur Zanetti, um jovem oriundo da cidade de São Caetano, Grande São Paulo, filho de uma família de classe média e de um esforço coletivo que o ajudaram a empreender a linda trajetória de sua vitória Olímpica em 2012.
Desejo que as lições que nos foram passadas por esse jovem de apenas 22 anos, nos auxiliem nessa nossa lida diária por vitórias pessoais e relacionais.
Cuidado e comprometimento familiar
Foi muito enriquecedor acompanhar as várias entrevistas e matérias produzidas sobre a vida de Arthur argolas de ouro, como ele ficou sendo chamado. E sempre começavam dizendo da atenção que a família teve para perceber a aptidão do filho para a ginástica e o incentivo que passou a dar para viabilizar o bom encaminhamento do dom que percebiam no filho.
Providenciaram apoio de treinos, que para nossa alegria existiam e existem no município de São Caetano como política pública, e continuaram lutando para permitir a chegada do treinador, um professor de educação física municipal que é coprodutor, junto com o próprio Arthur, do atleta que ele é hoje. Essa atitude familiar precisa ser louvada, bem como pode servir de espelho para outras famílias: os pais não foram sexistas, ou seja, não inibiram a jornada de atleta do filho, apenas porque ele não apresentava aptidão para futebol e sim para ginástica, esporte muito associado ao feminino.
Ainda no âmbito da família, em repetidos momentos, era narrado o fato de que muitos aparelhos nos quais Arthur treinou, eram réplicas produzidas pelo pai, de aparelhos estrangeiros, já que ele é metalúrgico e hábil na capacidade de criar objetos metálicos. Mais uma vez temos no que nos espelhar nas ações dessa família: ao invés do ‘queixume’ habitual de pessoas de menos posse financeira, que dizem não incentivar os sonhos de seus filhos por serem eles pobres, sem recursos financeiros para bancar aparelhos, e outros produtos necessários aos sonhos esportivos de seus filhos, o pai metalúrgico, não poupou horas de folga de seu ofício e com sua habilidade produziu o que não podia comprar!
Claro que precisamos de políticas públicas sérias que ofertem reais oportunidades para que nossas crianças e jovens cresçam podendo de fato abraçar e realizar sonhos. Mas o esforço precisa ser conjunto: sociedade civil e poder público, e é por isso que um sonho de realização, qualquer que seja, não pode ser sonhado sozinho.
‘Corpo’ de ajudantes para a vitória pessoal
Seguindo com as informações que nos foram democraticamente dadas, ouvimos também, em vários momentos, Arthur argolas de ouro elencar a gratidão dele a toda equipe de profissionais que empreendeu o caminho para a vitória. Além da família e treinador: psicóloga, nutricionista, fisioterapeuta, eram sempre citados pelo medalhista, lembrando sempre haviam muitas pessoas fazendo parte dessa conquista.
Mais uma vez, lições a aprender: a primeira delas diz respeito à gratidão. Infelizmente, percebemos o atual desuso dessa importantíssima virtude: a capacidade humana de agradecer. A gratidão engrandece o caráter da pessoa agradecida, melhora sua qualidade de vida, pois a pessoa grata vive mais a celebração da vida que seus obstáculos, mas também transborda seus benefícios para outros.
As pessoas que são reconhecidas em seu empenho participativo de comprometimento com o outro, sentem-se confirmadas como pessoas, elemento que coopera enormemente para elevar a qualidade de estima e de vida das pessoas, uma vez que precisamos do reconhecimento do outro para nos balizar relacional e pessoalmente.
A segunda grande lição vem do fato de nosso atleta vencedor andar na contracorrente tão vigente em nossa contemporânea sociedade consumista e competitiva, que dita padrões de ações e de comportamentos sempre recheados de um individualismo cruel: seja mais você, sempre vendo o outro como seu oponente.
Se seguisse essas máximas, Arthur jamais deveria mencionar os outros envolvidos em sua vitória. Afinal de contas, isso desviaria o foco de sua capacidade e abriria o pódio para outros atores sociais além dele. E foi exatamente isso que ele fez: subiu ao pódio da vitória, trazendo consigo a força grupal que o ajudou a conquistar a maior posição de sua modalidade esportiva.
Conclusão: sonho que se sonha junto é realidade
Como sempre a poética contida na alma e narrativa de nossos autores musicais nos auxilia a tecer as nossas considerações finais nas reflexões, e desta vez o nosso genial Raul Seixas, nos assegura que “Sonho que se sonha só, é só um sonho que se sonha só, mas sonho que se sonha junto é realidade”.
Não podemos duvidar disso por várias razões, mas também pela forma vitoriosamente coletiva com que o jovem Arthur Zanetti atingiu seu sonho de ser um medalhista de ouro em uma Olimpíada.
Que esse vitorioso exemplo, nos auxilie no percurso de nossos sonhos, que poderão ser realidade, mas seguramente só se forem sonhados juntos.
Prelúdio
Raul Seixas
Sonho que se sonha só
É só um sonho que se sonha só
Mas sonho que se sonha junto é
realida … de