por Valéria Meirelles
Ao longo dos séculos, o espaço definido no mundo ocidental para homens e mulheres foi rigorosamente demarcado: aos homens, cabia o domínio público e, conseqüentemente, a escolha de uma profissão e às mulheres, cabia o domínio privado: cuidar dos filhos e da casa, tendo sua imagem associada à candura, zelo e submissão.
Com a entrada das mulheres no mercado de trabalho e com o movimento feminista na década de 70, essa posição mudou. O trabalho assalariado se tornou o caminho para a independência feminina, para a ascensão social e, principalmente, possibilitou a construção e realização de projetos individuais não vinculados ao espaço doméstico.
Casamentos, uniões estáveis e vínculos afetivos sofreram várias transformações com essa nova realidade. Uma delas envolve o dinheiro, o qual segundo a terapeuta de casais norte-americana Cloé Madanes "Desempenha um papel importante e muitas vezes secreto na determinação de nossos relacionamentos, pois ele pode nos deixar mais próximos ou mais distantes daqueles que nós amamos, uma vez que tudo que nós fazemos com o dinheiro tem conseqüência para os outros".
Com a mulher trabalhando fora de casa, o dinheiro deixou de sair exclusivamente da mão do homem, e ela também passou a dividir o poder. Nós terapeutas sempre lembramos que os casais devem negociar quem vai ter poder sobre o quê e dividir áreas de responsabilidade. O dinheiro pode determinar quem terá ou não mais peso nas decisões familiares.
Nos casamentos atuais, nos quais ambos os cônjuges exercem alguma profissão ou carreira, normalmente as decisões são tomadas conjuntamente e o dinheiro tem uma função construtiva, de realização de projetos e aumento da qualidade de vida de todos.
Porém, existem situações em que a mulher tem maior ganho financeiro que o marido, ou ele fica desempregado. Nesses casos, a mulher se torna a principal provedora financeira, e está criada uma situação potencial de conflito, na qual muitas vezes, a mulher passa a dominar a relação.
Maciel Jr, em sua dissertação de Mestrado na (PUC-SP), perguntou aos homens de sua pesquisa como seria se suas mulheres ganhassem mais do que eles. Todos responderam que gostariam muito, pensando no aumento da renda familiar, mas ninguém explicou como seria a relação do casal a partir daquela mudança, o que demonstra a dificuldade do homem em se imaginar numa posição financeiramente inferior à mulher.
Em consultório, pude observar que nas relações onde as mulheres assumiam a responsabilidade pelas contas domésticas, até em função do sucesso profissional, houve desgaste entre o casal. Elas mesmas se sentiam incomodadas e até exploradas, como se estivessem fora de seu papel social e sem retaguarda. Já o homem se sentia "sem lugar", impotente e infeliz, comprovando dados dos pesquisadores Gray-Little e Brucks, de que casamentos onde a mulher domina a relação, são os mais infelizes.
Isso ocorre porque, o fato do homem ter uma posição social superior à da esposa parece estar de acordo com a ordem social tradicional, enquanto o inverso nem sempre parece natural. O sucesso infelizmente continua sendo apreciado segundo a lógica do masculino.
Ainda está muito arraigada em nossa sociedade, a importância do homem pagar as contas, como se ele representasse uma segurança à mulher. Uma segurança que ela mesma pode se proporcionar, mas "abre mão" disso.
Uma relação corre riscos quando o dinheiro se transforma em poder – incluindo o da mulher – e o casal deve conversar muito. Para sobreviverem a essas circunstâncias de vida, sugiro a eles:
Seis dicas para lidar com a situação
– Resolverem juntos todas as questões relacionadas ao dinheiro, incluindo a manutenção de um fluxo de caixa conjunto.
– Estabelecerem metas possíveis de serem atingidas.
– Tomarem decisões por um determinado período, estipulando "prazo de validade" para os acordos, afinal, a vida muda rapidamente.
– Estarem atentos a questões importantes e não esperarem que um adivinhe as satisfações ou insatisfações do outro.
– Reverem seus valores e serem muito flexíveis (aceitar que cada um tem expectativas diferentes em relação ao dinheiro)
– Tentar perceber que os conflitos em relação ao dinheiro não são, na maioria das vezes, sobre o dinheiro em si. Pensar no que estará por trás deles.
Para concluir, é importante saber que existem mitos e regras sociais que embora ultrapassadas, estranhamente norteiam as relações, e que não é tão fácil conviver como moderno.
A você leitora, que faz a maioria dos cheques em sua casa ou em seu relacionamento e se sente desconfortável, sugiro que repense com seu companheiro a forma como estão levando essa realidade. Enxerguem o dinheiro como uma força equilibradora, a fim de transformar essa vivência em uma alavanca de crescimento, transformação e união do casal.