Nossa espécie desenvolveu habilidades incríveis ao longo dos milênios: falamos, pensamos, fantasiamos, podemos aprender a ler e escrever se expostos a condições apropriadas de aprendizagem e por aí vai. O comportamento verbal nos levou a conquistas incríveis no campo da ciência e tecnologia.
Como tudo na vida, nada é perfeito. Palavras permeiam o lado duro da existência: declarações de guerra são comportamento verbal que explicita um confronto que se avizinha. Por meio das redes sociais massacres morais de indivíduos ou grupos acontecem todos os dias, mentiras nada caridosas são ditas entre amantes ou sócios, psicopatas costumam dominar as palavras com perfeição no intuito de tirarem vantagens de suas vítimas.
Há outro tipo peculiar de comportamento verbal que pode nos prejudicar imensamente. Somos capazes de assumir ao mesmo tempo o papel de falante e ouvinte, pensamos algo e a isso respondemos, um bate-bola sem fim. E assim produzimos um bocado de sofrimento.
O caso de um homem
Ontem vi na televisão o caso de um homem, trabalhador braçal, aparentava ser pouco instruído, ele provavelmente seria um hipocondríaco ou portador de transtorno obsessivo-compulsivo. Ele temia enormemente ser contaminado por micro-organismos, principalmente se precisasse ir a ambientes como hospitais e clínicas. Tinha poucos dentes, ir a dentista nem pensar. Imagino como isso atrapalhava sua alimentação e estética. Seu braço esquerdo fora acometido por um lipoma enorme, que exalava um odor desagradável, o lipoma fora infectado após aquela massa sofrer arranhões durante um acidente de trabalho. O homem chamava seu lipoma de batata, e o apelido fazia jus ao tamanho. Havia dor, os músculos do braço e costas estavam prejudicados pelo crescimento anômalo de tecido gorduroso.
Esse indivíduo há décadas tinha sua vida dominada pela ideia, distorcida e apavorante, de contaminação. Para ele, profissionais de saúde e ambientes hospitalares são perigosos porque causam doenças. Mas sua ferida estava seriamente infectada, e logo ele poderia ter sua vida ameaçada! O programa quase não fez menção ao efeito devastador desse transtorno psiquiátrico, apenas quiseram mostrar como uma dermatologista conseguiu conquistar a confiança desse paciente e remover o lipoma com pleno sucesso. Uma senhora, amiga e colega de trabalho do homem o incentivou ao longo do processo, até impedindo que ele fugisse da clínica no auge do desespero fóbico.
Podemos ser controlados pelo comportamento verbal
Essa é uma característica do comportamento verbal, podemos ser fortemente controlados por ele, a ponto de sermos prejudicados em níveis extremos. Uma mulher pode, por exemplo, permanecer se relacionando com um homem violento, e muitas razões influenciariam a dificuldade de se separar, mas uma delas tem natureza verbal, mesclada com a força de uma cultura machista. Por exemplo, regras como “mulher separada não consegue se manter sozinha, ou “mulher separada não presta”, podem favorecer o comportamento submisso.
No caso do homem com o lipoma infectado, ele passou a vida evitando situações que lhe davam medo, e teve, por décadas, uma vida cheia de restrições, fugindo desnecessariamente de situações supostamente perigosas, perdendo o convívio com pessoas queridas, descuidando da própria saúde etc.
Duvide das palavras
Palavras, duvide um bocadinho delas, principalmente se, ao obedecê-las, você estiver mergulhando cada vez mais numa teia de restrições, prejuízos, insensatez.
Busque ajuda profissional, abra com seu terapeuta um diálogo capaz de arejar ideias, que te aproxime de uma vida rica e te afaste da miserável condição em que a obediência cega às palavras te colocou. Sim, é difícil, eu também já fui iludida por palavras… Aliás, quem nunca?