por Roberto Goldkorn
Certamente vocês já devem ter ouvido falar, do Kama Sutra. Alguns poucos certamente já o leram, e outros (menos ainda) guardam o livro em casa, já cheio de “orelhas”, com algumas páginas despencando. Mas sem dúvida, é um livro famoso, e surpreendente, se pensarmos que foi escrito há séculos, na Índia (cultura que nada tem a ver com a nossa) e pasmem, é um manual de sexo!
Então, como é que com todos esses contras, o tal livrinho atravessa gerações, proibições, e vai sendo impresso, por todos que querem ganhar uns trocados certos no mundo editorial? Responder que é só porque é sobre sexo, não vale, o Alex Comfort, que foi um dos campeões de vendas na década de 70 com seu Os Prazeres do Sexo, onde anda? Sumiu, juntamente com o seu livro que certamente a maioria de vocês nem conhece nem lembra. Mas o Kama Sutra está aí, lido com curiosidade mesmo numa época onde qualquer vídeo locadora nos oferece um estoque alentado de vídeos com as mais variadas e pitorescas formas de sexo, e as novelas na TV, nos ensinam algo mais que o simples bê-á-bá erótico.
Mas o Kama Sutra, com a sua linguagem meio nerd e “sinistra” para os mais jovens, sobrevive, contra os mais lógicos prognósticos. Mas essa sobrevivência, é extremamente significativa para entendermos a nossa relação misteriosa e contraditória com o sexo.
Quem já teve a oportunidade de pelo menos folhear o Kama Sutra, deve ter ficado surpreso com o uso da linguagem poética para descrever o comportamento sexual fortemente ousado, com denso conteúdo erótico. E é aí que está o mistério e a resposta. Nós ainda vemos e pensamos o Sexo, com sua aura de romantismo e poesia, sentimos mesmo que nos cantos mais recônditos da nossa mente, o sexo como algo brumoso, mágico, cercado de atmosfera transcendental. Ou pelo menos é isso que no fundo (no recôndito lembram?) deveria ser. Não o é, na maioria das vezes, assim como a nossa vida nada lembra o script cheio de aventuras, liberdades e cenas épicas que um dia sonhamos para elas.
Mas o sexo, como mistério patrocinador da vida, de toda a vida, por mais banalizado que seja (ou esteja) a sua manifestação última – a cópula, permanece, mítico e desafiador na psique da humanidade. O sexo, que até os carrapatos e aligátores (nunca entendi como) fazem, e partilham com os humanos, não é o Sexo, que nos assombra e nos desafia. O Sexo, que para os orientais está na base de magias de transcendência, e intimamente ligado ao desenvolvimento espiritual, não é o mesmo dos filmes pornôs, mas de certa forma ele está insinuado no Kama Sutra. Por isso nos fascinamos tanto com esse “clássico da sacanagem oriental” como disse um amigo pernóstico, está longe de representar a visão ocidental da sexualidade, mas nos aproxima do alumbramento com que os orientais vêm a vida e a morte na dança sexual.
O Kama Sutra é isso, mostra o prazer pode ser preciso mas que viver seguramente não o é. A visão de uma “coluna de jade, penetrando impávida na caverna de seda e veludo” resgata no leitor ocidental o sexo como metáfora, como simbolismo, tão diferente daquele sexo denotativo, literal, direto, onde o homem “come a mulher” e ponto final. A delicadeza com que o autor indiano trata a “coisa sexual” me encanta, e sempre que leio, me lembra que o sexo pode ser muito mais do que aquilo que faço achando que é sexo. O Kama Sutra nos mostra de forma sutil, que o Sexo, não pode nos tornar deuses, mas certamente pode nos fazer mais HUMANOS.