Por Ceres Alves de Araujo
Vivemos na era da hiperconectividade. As novas tecnologias da comunicação e da informação são forças ambientais que estão afetando diretamente as condutas interativas e sociais do ser humano. Afetam também a concepção de si mesmo e da própria realidade, pois ofuscam a distinção entre realidade e virtualidade.
As redes eletrônicas são instrumentos de informação, instrumentos de construção de conhecimento, instrumentos de comunicação e instrumentos de lazer. Em muitos sentidos a vida ficou mais fácil e mais prazerosa.
Mas, é preciso se perguntar: que tipo de mundo se está criando? Estão sendo construídas as circunstâncias que aumentam as possibilidades de crescimento para a humanidade em termos de liberdade, de sociabilidade, de inteligência, de criatividade, de bem-estar, de autorregulação…? Ou se está construindo o contrário?
Como se constitui a família de hoje
Mais especificamente, pode-se perguntar: como está se constituindo a família atualmente, quando seus membros permanecem hiperconectados praticamente o tempo todo? A rapidez da comunicação via rede se tornou tranquilizadora para pais e para filhos, pois todos permanecem ligados. O tomar conta da era hiperconectada se tornou mais fácil, pois é possível localizar o filho e seguir seus deslocamentos com facilidade. Para as crianças a possibilidade de chamar os pais na hora que precisam pode garantir mais segurança. Há muitos aspectos positivos nessa forma de interação. Mas, o que se perde?
Já se tornou comum observar famílias em clubes, parques, ao redor da mesa de refeição, isto é em todos os lugares onde se agrupam, onde cada um permanece ligado ao seu celular. Os tópicos de conversa, por vezes, são motivados pelo que eventualmente um familiar descobre e comenta. Mas, mesmo assim, não há garantia de que ele seja escutado, dada o foco de atenção que cada um sustenta no próprio aparelho. O celular parece ter virado um prolongamento funcional da mão, no qual os olhos ficam pregados e os ouvidos interconectados.
Modificação da forma de cuidar de bebês
Em relação às famílias, cabe aqui um tópico importante a ser discutido: a modificação da forma de cuidar de bebês e crianças na primeiríssima infância. Sabe-se a importância da relação de apego que precisa ser estabelecida entre o ser humano nos seus primeiros tempos de vida e seu cuidador. Essa relação é constitutiva para o desenvolvimento mental do novo ser e ela se faz nas relações interpessoais presenciais, nas trocas olho a olho.
É preocupante a frequência com a qual hoje observamos bebês em seus carrinhos ou criancinhas sentadas ao lado de mães e babás, estando essas absorvidas em seus celulares. Muitas vezes as crianças ficam olhando o vazio, outras vezes buscam puxar o adulto pelas roupas para conseguirem um pouco de atenção. Algumas dessas pessoinhas crescem com a mania de pegar mesmo no rosto do outro e virarem para si para terem a garantia de poderem ser realmente o alvo de atenção. A comunicação pelo olhar, base para as trocas afetivas está se perdendo…
Fica incongruente a queixa de muitos pais em relação ao tempo que as crianças gastam presas aos eletrônicos. Esse foi e está sendo o modelo dado a elas. Está se criando, sem dúvida, uma geração de pessoas que dará privilégio ao mundo virtual em detrimento das relações interpessoais presenciais, pois esse é o modelo vigente. Está se aprendendo a viver assim e isso se torna para elas o padrão. Como as redes neurais se estruturam em função das relações interpessoais concretas, como ficará o cérebro das pessoas dessa nova geração?