por Rosemeire Zago
Muitos casais permanecem juntos após anos sem saberem o que os levam a morarem sob o mesmo teto. A maioria sequer pensa ou faz uma análise da qualidade da relação, simplesmente vão levando, como se nada sentissem. Alguns os mantêm pelos filhos, outros por interesses mútuos ou individuais onde não aceitam dividir o patrimônio, outros por crenças religiosas, pressão da família e preconceito claramente declarado contra pessoas separadas, dependência econômica, ou ainda, por medo da solidão. Enfim, os motivos para a manutenção da relação são muitos, mas na verdade ninguém fala sobre o assunto, como se não falar fosse garantia de nada sentir.
Aos poucos vai se instalando uma distância enorme, um verdadeiro abismo e apesar de nenhum dos dois estar feliz com a relação não conseguem conversar sobre isso. A maioria não percebe que ao se distanciar do outro, também está se distanciando de si mesmo. Vão se acumulando ressentimentos, mágoas, lágrimas, tristeza e assim muitos sintomas podem começar a se desenvolver e começa uma corrida por consultórios médicos e baterias de exames onde nada é diagnosticado, mas pode se perceber a irritação constante, a insatisfação, as dores musculares, a tensão e infelicidade sempre presente. Os filhos começam aos poucos a ficarem agressivos, diminuem o rendimento escolar, se envolvem com drogas, adoecem e nada está acontecendo?
O que faz com que as pessoas tenham tanto medo de entrar em contato com a relação afetiva, falar com o outro o que não está bem para quem sabe, juntos, tentarem melhorar? Por que esperar que a situação ou a presença do outro se torne insuportável? Muitos casais são capazes de manter uma relação sem troca, amizade, carinho, amor por anos ou quem sabe pelo resto da vida.
Como fuga alguns trabalham em excesso, outros comem, outros adoecem ou mantêm uma relação com outra pessoa, tudo em nome de manter o casamento. Que casamento? Será que isso significa realmente um casamento? Nem sempre são relações de brigas constantes, há casais que não brigam, não discutem, também nem se falam, a não ser o essencial, como há aqueles que já chegaram a agressões físicas e, ainda assim, continuam juntos sem nada mudarem.
Por que não falam o que sentem um ao outro? Por quer não dar uma chance da relação se tornar um pouco mais próxima do que cada um deseja? A dificuldade existe muitas vezes pelo fato de que para entrar em contato com o outro, terá que entrar em contato consigo mesmo e isso assusta muitas pessoas. É difícil permitir-se sentir os próprios sentimentos. Manter um diálogo com o outro requer que antes tenha um diálogo consigo mesmo.
Muitas pessoas procuram compensar, por meio do casamento, da vida a dois, seus problemas individuais não resolvidos e ao entrarem em contato com as dificuldades da relação, terão que entrar em contato também com as dificuldades que trazem. Por exemplo, o homem cuja mãe foi muito protetora e que não tendo conseguido se libertar desse forte vínculo, continua nutrindo-se da figura materna através da esposa. Ou a mulher cujo pai foi muito ausente, busca no marido a figura paterna que não teve. O casamento para cada um representa a repetição dos mesmos dramas infantis. Esse é um exemplo, mas existem muitos outros. E o amor que deveria ser o motivo primordial de qualquer vínculo conjugal vai deixando de existir.
Trazemos dentro de nós a necessidade de resolução de conflitos não resolvidos de toda uma vida e que não podem, nem devem, nem serão solucionados com o casamento. Muito pelo contrário, tudo tende a se acentuar com o passar dos anos. É preciso perceber que nossas ações têm consequências para nós mesmos, ainda que muitas dessas consequências ocorram de modo inconsciente, ou seja, a pessoa sequer percebe.
Mas não se justifica, portanto, manter uma relação a dois sem prazer, sem satisfação, sem querer, sem amor. Deve-se sim, identificar as causas do distanciamento, quando tudo começou, conversar sobre tudo isso com o (a) parceiro (a) e juntos buscarem uma solução, evitando-se assim que um dos dois seja surpreendido com um pedido de separação, como tantas vezes acontece.
Enfrente seus sentimentos sem medo, só assim será possível dissolver tudo que traz sofrimento, e participe ao outro tudo isso sem deixar para amanhã ou quem sabe um dia. Assim será possível ainda conservar os laços de amor caso eles existam, pois a resolução dos conflitos de uma relação não implica necessariamente em separação, mas, principalmente, transformação e reconstrução.