por Elisandra Villela Gasparetto Sé
21 de setembro é o Dia Mundial do Alzheimer, uma forma de voltar a nossa atenção para essa forma de demência, que quando se instala, é progressiva e não tem cura. Não existe uma fórmula mágica capaz de garantir que não vamos desenvolver demência, mas podemos nos cuidar, nos proteger, proporcionando um estilo de vida saudável desde cedo.
Estudos da neurociência têm corroborado para explicar: a dinâmica das habilidades cognitivas e conhecimentos acumulados ao longo da vida, o alcance de um envelhecimento normal do cérebro – protegido de perdas intelectuais associados ao processo de envelhecimento.
Embora esteja bem estabelecido que um estilo de vida saudável reduz o risco de déficit de memória e cognição mais tarde na vida, os estudos do pesquisador Bob Woods, da Bangor University, Reino Unido, demonstra que as pessoas podem desenvolver uma forma de “resiliência mental” mais precocemente por meio da educação e de ocupações mentalmente desafiadoras, o que se acrescenta ao efeito do estilo de vida. Essa resiliência, que é descrita como "reserva cognitiva", pode continuar a se desenvolver mais tarde na vida com atividades mentalmente estimulantes.
A estimulação mental precoce pode impedir declínio cognitivo na vida adulta e na velhice.
Estimular o cérebro no início da vida e na meia-idade por meio de atividades cognitivas desafiadoras, ensino superior e trabalhos complexos podem ajudar as pessoas a permanecerem mentalmente aptas mais tarde na vida, de acordo com as pesquisas que fornecem evidência à teoria da "reserva cognitiva".
O que é ter reserva cognitiva na prática?
A reserva cognitiva é a capacidade do cérebro de armazenar por períodos prolongados as habilidades que foram adquiridas ao longo da vida e de resistir aos prejuízos de um quadro demencial, evitando o surgimento de sintomas clínicos significativos no início da doença.
Sabe-se que as doenças neurodegenerativas são progressivas. No entanto, a reserva cognitiva permite que o progresso da doença seja bem mais lento do que o habitual.
Os pesquisadores exploraram o efeito mediador da reserva cognitiva na associação entre fatores de estilo de vida saudável e função cognitiva na vida adulta. Eles analisaram dados coletados de 2011 a 2013 e de 2015 de adultos cognitivamente saudáveis com 65 anos ou mais no estudo (Cognitive Function and Ageing Study Wales) e após controlar os grupos por idade, sexo e doenças crônicas, foi observado que a atividade cognitiva e social, atividade física, dieta saudável e consumo de álcool – de leve a moderado – estavam positivamente associados à função cognitiva. Juntos, esses fatores representaram 20% de ganhos nos escores dos testes cognitivos.
Assim, a reserva cognitiva, classificada por escolaridade e complexidade ocupacional, foi um importante mediador dessa associação. Os efeitos indiretos da reserva cognitiva contribuíram com 20% do efeito total sobre a cognição, relatam os pesquisadores.
Woods afirma que foi observado que as pessoas com um estilo de vida mais saudável tinham melhor pontuação em testes de capacidade mental e isso foi parcialmente explicado pelo nível de reserva cognitiva dos participantes do estudo.
Nos últimos anos, foram feitas descobertas importantes no campo das neurociências para elevar a qualidade de vida da população, principalmente dos idosos, já que eles são muito suscetíveis aos fatores de riscos para o desenvolvimento de doenças neurogenerativas, como os quadros demenciais. Assim como o corpo pode desenvolver reserva de gordura ao longo dos anos, também pode manter uma reserva cognitiva que adiaria os sintomas dos quadros degenerativos. Portanto, a reserva cognitiva pode ser considerada uma garantia mental que nos protege contra a patologia relacionada à idade.
Como construir a reserva cognitiva ao longo da vida
Podemos construir nossa reserva cognitiva durante a vida por meio da educação, e durante a meia-idade, com nossa ocupação, trabalho, atividades de lazer e redes de relações sociais, nos desafiando mentalmente.
O cérebro tem uma habilidade contínua de se reorganizar, estabelecendo novos padrões de funcionamento, de acordo com as exigências do meio ambiente e a reserva cognitiva contribui para essa reorganização cerebral e funcional. Essa capacidade de reorganização é o que chamamos de neuroplasticidade.
Adotar um estilo de vida saudável – exercícios físicos, dieta saudável, envolvimento em atividades sociais e mentalmente estimulantes – é bom para o coração e para o cérebro.
Há a hipótese de que pessoas com maiores habilidades cognitivas apresentem mais chances de ter uma reserva cognitiva. O nível de escolaridade, além da capacidade intelectual, o tipo de trabalho que a pessoa exerceu ao longo da vida contribui para o desenvolvimento da reserva cognitiva, por exemplo, atividades ocupacionais que exigem o raciocínio, o esforço intelectual e a exposição aos desafios.
Quando um indivíduo se expõe a uma tarefa desafiadora, cria-se uma série de conexões entre os neurônios, e essa estimulação neuronal, desenvolve, ao longo do tempo, uma boa reserva cognitiva.
Outros aspectos do estilo de vida podem aumentar a reserva cognitiva, tornando o cérebro mais resistente, como o nível educacional, os exercícios físicos, as atividades de lazer e os relacionamentos sociais.
É importante ressaltar que já na infância podemos incentivar as crianças a desafios próprios para sua idade, através de jogos, brincadeiras, prática de esportes, motivá-las para a leitura e a cultura de modo geral. Ensinar às crianças hábitos mais saudáveis fará com que na fase adulta elas tenham escolhas saudáveis, criando uma reserva cognitiva de oferecer uma qualidade de vida melhor na velhice.
Conforme a teoria da reserva cognitiva, aspectos do estilo de vida podem modificar o padrão usado pelo cérebro para mediar uma tarefa e para utilizar redes neurais alternativas, tornando o cérebro mais eficiente e resiliente diante de fatores de riscos para doenças cerebrais.