Por Monica Aiub
Em tempos não muito distantes era comum presenciar, em época de final de ano, pessoas traçando suas retrospectivas, lembrando dos momentos vividos no ano, fazendo um “balanço” dos acontecimentos positivos e negativos, utilizando ou não esses dados e lembranças para programar o ano seguinte, ou para aprender algo sobre a vida; compartilhando ou não esses dados com outras pessoas.
Hoje é comum visualizar pessoas compartilhando a retrospectiva “feita” pelos algoritmos das redes sociais.
Ao fazer uma retrospectiva, utilizamos critérios próprios para valorar o vivido; para definir o que foi importante e merece ser lembrado; o que foi positivo ou negativo; o que devemos ou não aprender com o vivido; entre outras coisas.
Estabelecer critérios é importante para o viver, pois é segundo eles que orientamos nossas escolhas e ações futuras. Quais os critérios “estabelecidos” pelas redes sociais para definir o que foi importante em nossas vidas durante um período? Acessos? Curtidas? Popularidade? Ou “teriam”, as redes sociais, a “capacidade” de ler nossas mentes e estabelecer critérios que nós mesmos estabeleceríamos, como alguns pensam?
Numa simples busca na rede, é possível encontrar notícias sobre algoritmos capazes de muitas coisas, tais como: reconhecer rostos (Universidade de Hong Kong); diagnosticar depressão (Universidade de Vermont e Universidade de Harvard); identificar sarcasmo (Universidade Hebraica); determinar personalidade (Universidade de Stanford e Universidade de Cambridge), resumir textos (empresa Salesforce); identificar usuário bêbado (Universidade de Rochester); produzir arte criativa (Universidade de Rutgers); identificar orientação sexual por análise facial (Universidade de Stanford); decodificar pensamentos (Universidade da Califórnia), entre outras.
As notícias, em sua maioria, afirmam que o algoritmo pode ser mais preciso que a análise humana. Por exemplo, o algoritmo capaz de determinar a personalidade é, segundo a notícia, mais preciso que amigos e familiares.
Mas o que é um algoritmo?
O que lhe dá esse poder de identificação, decodificação ou previsibilidade maior que as capacidades humanas?
Um algoritmo é uma espécie de “receita”, passos que necessariamente devemos seguir para resolver um problema ou executar uma tarefa. Por exemplo, os passos para uma operação em matemática (pense nas quatro operações básicas: soma, subtração, divisão, multiplicação); os passos para dirigir um automóvel; os passos para um procedimento científico etc.
Os computadores funcionam a partir de uma programação, isto é, instruções sobre como um problema deve ser resolvido. Com isso, quero dizer que o computador no qual escrevo este texto não cria soluções, mas executa tarefas de acordo com sua programação, ou seja, com as instruções previamente inseridas nele a partir de um software composto de algoritmos. Mais especificamente, as tarefas executadas por nossos computadores pessoais, smartphones, celulares, tablets etc são programadas previamente, por seres humanos como nós. Antes, eram tarefas também executadas por nós, mas para facilitar nossa vida, ganharmos tempo, os computadores são programados para executá-las de modo mais rápido.
A eficiência e a eficácia do processo não é uma característica própria do computador, mas depende da programação conter algoritmos que descrevam clara e precisamente os passos a serem seguidos.
Você já fez um bolo seguindo, passo a passo uma receita? Já fez um cálculo matemático, seguindo passo a passo os procedimentos a serem aplicados? Já seguiu um roteiro de viagem passo a passo? O algoritmo é esse “passo a passo”.
É claro que nem todo algoritmo é tão simples quanto uma receita de bolo ou os procedimentos para uma soma básica em matemática. Os chamados algoritmos genéticos, baseados na evolução biológica, mais especificamente, na genética populacional, funcionam a partir do modelo de sistemas adaptativos, tentando gerar soluções aceitáveis para os problemas a partir de conhecimentos acumulados sobre os mesmos. Não trabalham codificando um parâmetro de solução, mas conjuntos de parâmetros; não trabalham com indivíduos, mas com populações; utilizam-se de informações sobre custos e recompensas, e de regras probabilísticas e não determinísticas.
Em outras palavras, tentam replicar os processos da evolução biológica, não apenas apresentando um passo a passo determinístico, e sim atuando a partir de cálculos de probabilidade. Neste caso, os elementos históricos, referentes à origem do problema e formas anteriormente testadas para solução, são fontes de conhecimento que integram o cálculo probabilístico.
O leitor deve estar pensando: Mas o que tudo isso tem a ver com filosofia? E mais, qual a relação com a retrospectiva 2017?
Em uma breve reflexão, se você acredita, como muitas pessoas, que um software de uma rede social sabe mais sobre você do que seus parentes e amigos, se você acredita que os critérios estabelecidos pelo programador do software são mais relevantes que os critérios que você estabeleceria e, se, além disso, acredita que o estudo da matemática, da história, das ciências, da filosofia, das artes não são importantes porque todo o conhecimento que você precisa está disponível na internet, lembre-se que os buscadores executam tarefas descritas em algoritmos, com critérios estabelecidos por programadores, de acordo com os objetivos para os quais foram contratados.
Algoritmos, todos nós podemos criar, podemos também executar tarefas segundo os algoritmos que criamos, mas eles não representam aquilo que somos, nem são capazes de ter um conhecimento sobre nós maior do que aquele nós mesmos temos ou as pessoas com as quais convivemos possuem. Mais importante, eles não decodificam para nós, nossos próprios pensamentos, sentimentos, sonhos, desejos, crenças. Eles apenas categorizam padrões a partir de critérios e regras estabelecidos, às vezes arbitrariamente, a fim de obter certos resultados; às vezes a partir de um estudo histórico de nossos comportamentos, em geral, também tentando obter certos resultados interessantes àqueles que “lucram” com a rede.
Para além dos algoritmos das redes sociais, quais os seus critérios para a retrospectiva 2017 e, diante deles, o que você aprendeu durante este ano que poderá tornar o mundo e nossas vidas melhores?