por Elisandra Vilella G. Sé
Desde a antiga filosofia grega e através dos tempos modernos, a sabedoria tem sido considerada como o pico, o topo do conhecimento sobre a condição humana. A sabedoria (sapientia) é freqüentemente considerada como um desempenho de alto nível de conhecimento e é um fenômeno de grande interesse papa qualquer área.
Sabedoria é conceituada como um sistema de conhecimento especializado, um sistema altamente desenvolvido de conhecimento relativo a procedimentos e relativo a fatos e de julgamento para lidar com o que chamamos de pragmática da vida, isto é, aos assuntos de vida importantes, circunstâncias do dia-a-dia, resolução de problemas, aspectos morais, dinâmicas e conflitos da vida, desafios e eventos estressores ou não, capacidade de entender e lidar com incertezas, fazer inferências e aventar hipótese. Envolve conhecimento, julgamento e aconselhamento sobre o curso de vida, variações, condições, valores, conduta e significado da vida.
A sabedoria tem se destacado como o principal exemplo de um forma de conhecimento avançado, típico da vida adulta. Isso não significa caracterizar a sabedoria como estágio final da aquisição de conhecimento ao longo do desenvolvimento humano no sentido absoluto da palavra. A ênfase aqui é que a sabedoria é um corpo ou um sistema de conhecimento, e não uma descrição de indivíduos que possam ser chamados de sábios, ou portadores de sabedoria.
Pesquisadores têm se esforçado em investigar temas e metas evolutivas que possam servir como organizadores para o progresso evolutivo durante a segunda metade da vida, que é a maturidade. A sabedoria tem sido mencionada como o nível máximo, o pico do conhecimento humano. A árvore da sabedoria, uma famosa peça de arte da Idade Média, era uma expressão concreta dessa visão do mundo ocidental.
Na árvore, as sete artes liberais (astronomia, geometria, música, aritmética, gramática, retórica e dialética) figuravam como galhos de uma árvore em cujo topo aparecia a sabedoria. A reunião das artes liberais numa totalidade de conhecimento constituía a sabedoria. Não é de se espantar, então que a aquisição da sabedoria levava toda uma vida e que era reservada apenas a alguns.
No contexto gerontológico, o interesse é compreender a relação entre sabedoria e o envelhecimento humano. A sabedoria é um indicador de um envelhecimento bem-sucedido? Esta pergunta já foi feita na obra “De Senectude” do filósofo romano Cícero escrito por volta do ano 50 a.C.
O autor Torres Pastorino em “Minutos de Sabedoria” afirma que nosso verdadeiro destino é a Sabedoria. Todos nós caminhamos para ela. Durante a segunda metade do século XX, muitos outros teóricos propuseram estágios ou estados de alto nível para as últimas fases da vida. Além disso, tem havido muito discussão sobre as tarefas e o contexto da vida adulta.
O envelhecimento humano pode sim preservar a possibilidade de desenvolvimento e mesmo o alcance de picos de desempenhos intelectuais.
Sabemos que alguns aspectos da inteligência cristalizada, isto é, processos intelectuais como a compreensão oral, a capacidade de resolução de problemas do dia-a-dia, raciocínio, formação de conceitos, aprendidos com a influência da cultura, não declinam com os processos de envelhecimento e podem apresentar progressos, desde que existam oportunidades culturais. Por isso é que muito idosos, se não portadores de doenças cerebrais, possuem a capacidade de se engajar em esforços direcionados ao seu próprio desenvolvimento, de adquirir novas capacidades, aprender coisas novas, se beneficiar de treinamento da memória ou de fortalecer antigos potenciais.
Carreiras de grandes artistas e especialistas em diversos campos profissionais é uma prova de que as habilidades podem ser mantidas e ampliadas na velhice. Além disso, existem evidências de que os idosos podem ser superiores em algumas tarefas de raciocínio associado a questões de inteligência social e prática e à integração entre o afeto e o conhecimento. Dados de pesquisas mostram que idosos se saíram tão bem ou eventualmente melhor que adultos jovens, em tarefas cognitivas.
O funcionamento intelectual depende da integração entre dois conjuntos de capacidades: as determinadas pela biologia e pela cultura básica e as determinadas pela experiência sócio-cultural.
A experiência é associada com um aumento no estoque de conhecimentos que podem facilitar o desempenho intelectual. Especialistas em um domínio particular podem ser diferenciados de novatos em quantidade de conhecimento, mas, sobretudo, na organização e na flexibilidade em usar esse conhecimento.
Os aspectos qualitativos, em particular, as estratégias, o uso da intuição, ajuda a distinguir melhor os maiores especialistas em domínios em que muitas pessoas são capazes de se especializar ou de adquirir conhecimento através da educação formal. Tais conhecimentos podem caracterizar desde a alta especialização profissional, artística, política ou outra.
O conjunto de capacidades determinadas pela experiência sócio-cultural refere-se a um conjunto de conhecimentos relativos a fatos ricos que a pessoa armazena em sua memória de longo prazo, conhecimentos de assuntos da vida, como se fosse uma enciclopédia de múltiplas referências.
Esse conhecimento permite a pessoa entender e interpretar as ações de outra pessoa, ter menos dúvidas e agir mais diretamente em eventos freqüentemente experenciados. Possibilitando assim a pessoa utilizar melhor seu repertório de procedimentos mentais para selecionar, ordenar e manipular informações para tomar decisões e planejar ações.
Assim espera-se que uma pessoa com acúmulos de conhecimentos determinados tanto pela educação formal ou pela experiência na pragmática fundamental da vida mostre suficiente flexibilidade de valores ao interpretar histórias de vida e decisões de vida dos outros. São capazes de reconhecer que existem inúmeras interpretações e soluções diferentes. Um conhecimento sábio implica num potencial para julgar qual interpretação ou solução é mais apropriada a uma situação particular, perspectiva ou valor.
Com relação à incerteza ou melhor aquilo que é imprevisível, uma vez que sabemos que nunca se pode saber tudo sobre um problema ou sobre a vida e o futuro não é totalmente previsível; estudos sugerem que pessoas sábias destacam-se no questionamento, porque têm mais insights sobre as incertezas e as dúvidas que cercam os assuntos vitais e as áreas de conhecimento sobre as quais não têm informação. Uma medida de sabedoria pode ser a capacidade de admitir não saber.
Adultos mais velhos e idosos podem apresentar padrões de comportamento apontados como sábios, graças à sua capacidade de se lembrar e de falar de fatos e procedimentos, de fazer novas associações, de aventar hipóteses explicativas, de fazer análises éticas e morais e de oferecer alternativas de solução de problemas baseadas na experiência acumulada.
É importante ressaltar que a idade avançada e a velhice não é fator que desencadeie a sabedoria. A sabedoria depende de uma vida rica em experiências em associação com motivação, fatores sociais, de personalidade, e de oportunidades sócioculturais.
De acordo com várias pesquisas, espera-se que o início da sabedoria ocorre bem tarde na vida. Ela representa algo similar a um objetivo do desenvolvimento, que direciona o funcionamento intelectual e da personalidade para o envelhecimento.
O processo de envelhecimento não significa uma descontinuidade do desempenho intelectual e declínio na capacidade de se adaptar às exigências do ambiente.
As reservas de experiências podem ser ativadas e otimizadas pelos mais velhos, de modo a compensar as mudanças advindas com o avançar da idade, como perdas auditivas ou visuais que podem prejudicar o processamento de informação.
O envelhecimento intelectual é heterogêneo, isto é, ocorre de modo diferente para cada pessoa, em contextos históricos e sociais diferentes. A sabedoria na velhice é largamente influenciada pelo autoconhecimento, pelas crenças sobre as próprias capacidades, pelas metas pessoais e pelas emoções.