por Patricia Gebrim
Quem é você?
Eu sei que não é usual, mas vou pedir que antes de começar a ler, você pegue lápis e papel e faça uma breve descrição de seu próprio eu.
Pegou?
Ei! Cuide para que sua descrição fale do seu interior, ok? Espero você na próxima linha!
De alguma maneira quando nos referimos ao nosso "Eu", falamos com tanta propriedade, que acabamos acreditando e passando a ideia de que sabemos exatamente tudo o que somos. Eu tenho uma amiga, por exemplo, que sempre se descreveu e mostrou ser uma pessoa calma, controlada, sempre correta, daquelas que nunca perdem a hora ou esquecem de ligar no dia do aniversário de alguém. Até mesmo os seus cabelos acreditavam nisso, porque mesmo em meio a um furacão, continuavam irritantemente arrumados, sem nem mesmo um fio fora do lugar! Isso até o dia em que se viu no trânsito, olhos vermelhos, irada, berrando alucinadamente e perseguindo na contramão, o motoqueiro que sem querer esbarrou no espelho retrovisor de seu carro.
O que aconteceu com ela? – você pode estar se perguntando – Ficou maluca? Ou então você pode estar pensando que talvez ela nunca tenha sido calma e que na verdade era uma alucinada disfarçada de cordeiro. Isso porque em geral nós sempre pensamos que as pessoas são isso "ou" aquilo. Pensamos que "ou" a pessoa nos ama, "ou" não nos ama. "Ou" é boa, "ou" má, e ponto final!
Fórmula do 'e'
O que eu proponho agora é que você arrisque, pelo menos durante a leitura deste texto, a trocar o "ou" pelo "e". Voltando à minha amiga, usando a fórmula do "e", eu poderia arriscar a dizer que ela era uma pessoa calma "e", ao mesmo tempo, uma pessoa raivosa, capaz de babar no capacete do motoqueiro, que de tão assustado quase bateu na banca de jornal.
O mesmo acontece com todos nós. Quando pensamos em nosso "Eu", na verdade seria muito mais correto imaginarmos muitos "Eus" convivendo lado a lado. Quanto mais conhecemos cada um desses "Eus" e quanto mais contato um "Eu" tem com o outro, mais chance temos de ter uma vida pacífica. Mas quando esses "Eus" não se conhecem, e cada um tem a sua própria ideia da direção a seguir, fica difícil um acordo entre eles e o nosso espaço interno vira um verdadeiro campo de batalha.
Para ajudar você a visualizar tudo isso vou apresentar brevemente esses "Eus", que se acotovelam dentro de nós. Alguma vez você já sentiu uma cotovelada no estômago?
Vou começar pelo Eu criança. Todos nós temos uma criança dentro de nós. (Até você, acredite!) A criança dentro de você é aquela parte inocente, criativa, brincalhona e, sobretudo, espontânea. É ela que fica ansiosa quando você vai fazer alguma coisa nova. É ela que deixa você totalmente travado em frente a uma pessoa que você reconheça como uma autoridade. É a criança que faz com que você às vezes se sinta inseguro, mesmo sem motivo aparente. Ou que torna você teimoso, birrento e mimado, querendo que tudo aconteça exatamente como planejou.
Agora o Eu inferior, aquele lado que temos, mas gostaríamos de não ter. O Eu Inferior é feito de todos aqueles sentimentos que consideramos negativos e que somos ensinados a evitar. É o "Eu" que sente ciúme, inveja, raiva, pensa coisas horríveis, persegue motoqueiros e muitas vezes tem uma assustadora vontade de "esganar" alguém. É como um bicho dentro de nós, que muitas vezes nos assusta até mais do que aos outros. Basta ver alguém em meio a um acesso de fúria para ter uma boa ideia desse tal de Eu Inferior.
S-o-c-o-r-r-o! Quando nos damos conta de que temos esse monstro horrendo dentro de nós, entramos em pânico e logo nos empenhamos em construir uma máscara para esconder essa aberração. Assim surge o "Eu mascarado". Falso, falso, falso, esse "Eu" é uma criação, uma tentativa de sermos aceitos pelas pessoas e pela sociedade. É aquela parte que tenta ser boazinha, ou sábia, ou poderosa, e por aí vai. Tudo fingimento, é claro! Mas às vezes fingimos tanto e tão bem, que até nós mesmos acabamos acreditando que aquilo é real.
Você está localizando cada um desses "Eus" em você? Então imagine a seguinte situação… Sabe quando você vê, ao longe, aquela pessoa chata que sempre gruda em você e fala, fala, fala, sem perguntar se você queria ouvir? O Seu Eu Criança talvez tenha vontade de sair correndo e se esconder atrás do poste antes que ela veja você. O Eu Inferior, por sua vez, talvez tenha o impulso de rosnar algo assim: "Como você consegue ser tão chata? Não suporto ficar ao seu lado, sabia?". Mas a Máscara é aquela parte sua que fica ouvindo, com cara de melão, sorriso amarelo pendurado, enquanto você pensa no tempo que está perdendo e torce para que aquela tortura termine logo de uma vez (é claro que isso nunca acontece, porque pessoas chatas assim a-d-o-r-a-m caras de melão!).
Calma, nem tudo está perdido! Dentro de todos nós existe também um Eu que reflete o que temos de melhor. Acredite, todo ser humano possui dentro de si a capacidade de ser sábio, de amar, de respeitar a si mesmo e ao próximo, de perdoar, e muito mais. Estou falando do "Eu superior". Quando permitimos que esse Eu conduza nossa vida, aprendemos a lidar com o Eu Criança, a aceitá-lo, a amá-lo e ajudá-lo a crescer. É o Eu Superior que pode nos ajudar a curar o Eu Inferior, a transformar criativamente essa negatividade em uma força positiva. É o Eu Superior que nos ajuda a abrir mão das máscaras e a nos aceitar exatamente como somos, pois ele nos lembra que somos divinos (com apimentados toques de imperfeições, é claro!). Leveza e humor são qualidades do Eu Superior e tornam todo o resto muito mais fácil.
Bem, acho que agora você já tem uma ideia geral. Vou indo por enquanto, mas deixo a sugestão de que você releia a descrição que fez de você mesmo e permita agora que TODOS os seus 'Eus' tenham espaço para se descrever na lista. Pode ser divertido, acredite!