Todos nós buscamos o livre-arbítrio

Por Roberto Goldkorn

Há muitos e muitos anos escuto dos ‘esotéricos’ que nós estamos aqui (no planeta Terra) para evoluir. Dizem e repetem como papagaios que a reencarnação é um processo de aprendizagem contínua. Ou seja, reencarnamos para aprender, como se fosse um processo escolar – primeiro grau, segundo grau, faculdade, pós-graduação… Dizem também que a cada encarnação decidimos por esse ou aquele caminho graças ao nosso ‘livre-arbítrio’. Dizem que uma vez a gente vem como rei, outra como mendigo, para podermos experienciar de tudo um pouco. Nada disso no entanto, é verdade! Na verdade isso nada mais é do que aquela manifestação do nosso inconsciente que os americanos chamam the wishful thinking, ou seja, pensamos ser verdade aquilo que de verdade queremos ou desejamos intensamente.

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Mas antes de continuar preciso fazer uma parada técnica. As pessoas que me conhecem, que leram os meus livros devem estar pensando: ele pirou, está negando tudo no que acredita. A essas pessoas eu tranqüilizo e peço para voltarem ao início do texto e relê-lo. Não estou negando o processo de reencarnação no qual acredito vivamente e como já disse várias vezes, posso provar a existência! O que quero demonstrar aqui, é que esse processo, está longe de representar um desígnio moral e edificante. Não reencarnamos para melhorar, nem para aprender a viver, reencarnamos por que simplesmente não sabemos fazer outra coisas – como se diz em Direito é uma coação irresistível. Reencarnamos porque somos atraídos magneticamente de volta ao planeta e todos as suas atrações. Reencarnamos porque sempre deixamos o rabo preso aqui: amores frustrados, relações inconclusas, vinganças, débitos, vínculos de família, busca de uma 2ª (3ª,4ª,5ª) chance, e em muitos casos reencarnam por compulsão.

Passos de Hitler

Imaginem a quantidade de seres que reencarnam sem nem mesmo ter uma família para atrai-lo e aninhá-lo, apenas pelo desejo intenso, obstinado, ensandecido de estar no plano denso, lúbrico, das sensações e paixões que é a nossa vida física, nesse planeta. Imaginem alguém como Hitler ou o ex-presidente da Iugoslávia Slobodan Milosevic, e certos traficantes, bandidos cruéis, se eles estão dando um passo adiante no caminho da evolução. Não, olhando-se de um ponto de vista bem distanciado, como os olhos do ‘macro’, pode-se dizer que o processo de reencarnação visa a evolução, como evoluem o planeta, a galáxia, o universo em direção ao aprimoramento, mas não moral. Até porque moral é uma coisa cultural, variável. O que é moralmente aceitável para uns é abominável para outros tantos. Isso não quer dizer que alguns de nós, não possamos também fazer da reencarnação um grande aprendizado, claro que podemos.

Na verdade o que todo ser esclarecido busca é conseguir aquilo que dizem já termos de forma congênita – o livre-arbítrio! Qualquer um que conhece um mínimo sobre psicanálise, ou mesmo observa com mais cuidado o comportamento humano, sabe que somos meio cegos, meio surdos, meio bobos, meio aleijados. Amamos loucamente a quem não conhecemos, e quando passamos a conhecer melhor – odiamos loucamente. Não sabemos nem mesmo quem somos, ou quantos somos habitando dentro de um só corpo. Somos todos, uns mais outros menos, versões do ‘médico e o monstro’, ou dos perturbados que abrigam múltiplas personalidades cada uma com um nome e um RG. Onde está esse livre-arbítrio, se as decisões que tomamos em nossas vidas são em grande parte motivadas pelo inconsciente, ou pelo ‘transe cultural’ (Jung), ou pelos determinismos genéticos que ainda estamos longe de desvendar em toda a sua extensão?

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Querer é poder? Conte outra, pois não só não temos aquilo que queremos, como muitas vezes queremos aquilo que não devíamos querer, e até podemos obter, aí já é tarde. Padre Antônio Vieira em um de seus famosos sermões, disse: “Só Jesus amou, por que amou sabendo…”.  Não concordo com o advérbio só, mas concordo que amar sabendo, ou seja, com plena consciência de quem eram aqueles que estavam sendo amados, e o que se podia esperar deles, é um atributo do verdadeiro livre-arbítrio. Aprender a Ser, descobrir quem de verdade somos, corrigir com lucidez os rumos da nossa vida, sabendo que ela não se encerra numa encarnação breve e fugidia, escolher caminhos luminosos, não imediatistas, desvencilharmos-nos de dogmas, prescrições feitas por outros homens em determinadas épocas da história, procurar ocupar os espaços ociosos da nossa psique (mente) com nossas próprias e genuínas experiências, esses são apenas alguns dos pré-requisitos para conquistar um dia o livre-arbítrio.

É claro que isso é uma tarefa monumental, por isso, continuaremos a reencarnar, repetindo os mesmos erros, as mesmas palavras de ordem, os mesmos esquemas furados que já no passado levaram a sofrimento e frustração. Mas é assim mesmo. Para os nossos olhos ansiosos de presente, tudo é muito demorado, mas a vida tem seu próprio ritmo, e vai seguir adiante como um imenso rio caudaloso que de tão lento parece um lago, mas que segue o seu caminho inexorável até o oceano.

 

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