por Lilian Graziano
A dor da perda vivenciada por famílias de 19 nacionalidades, com filhos jovens falecidos e feridos nos atentados de 13 de novembro em Paris, não se pode negar, disfarçar, transformar em outro sentimento que não seja tristeza ou revolta. O mesmo ocorre com os nossos flagelados do "mar de lama" que invadiu o Rio Doce, aqui mesmo no Brasil. Trata-se de uma realidade, porém, também capaz de revelar o que há de mais humano e positivo em nós.
Falo de altruísmo, compaixão, bravura… e forças pessoais (veja aqui) que se integram ao cenário de superação dessa tragédia – vindo de quem sofreu na pele a desgraça, ou de quem, simplesmente, colocou-se nesse lugar. É desse impulso de transpor desafios imensuráveis que trata a Psicologia Positiva. E desse olhar sobre o que emerge inabalável de acontecimentos tão difíceis de digerir.
Observo que a pauta "solidariedade", que expõe muito bem esse arsenal positivo, esteve destacada na cobertura midiática tanto no episódio francês, como no episódio de Mariana (MG) e outras cidades atingidas pelo curso dos rejeitos de barragens rompidas. Isso muito embora os noticiários repitam exaustivamente as imagens do povo desesperado, de corpos sendo arrastados pelas ruas, inertes ou boiando em lamaçais.
Foram lembradas com ênfase as pessoas que abriram suas portas para estranhos, dando-lhes onde passar a noite, após o fechamento de metrôs e ruas parisienses. Foram lembrados os alertas e grupos das redes sociais que não tardaram em auxiliar (e até salvar) muita gente envolvida no tumulto registrado na Cidade-luz. Não demorou para que se divulgassem brasileiros preocupados com os donativos necessários, até mesmo para os animais desabrigados na lama mineira, organizando-se para ajudar aqueles que nunca deveriam ter passado por isso, ainda que a revolta pelo descaso público e privado (privatizado, seria o caso dizer) com o fato lhes corroesse os cotovelos.
Mais do que isso, bastante divulgada foi a vida em curso diante disso tudo, mostrando um dia seguinte de perspectivas: tocar a vida, exigir providências, dar o próximo passo, estar de pé.
Não que nunca tenha havido esse tipo de cobertura – sempre se falou da solidariedade brasileira, e de nossa fleugma invejável na enchente, na seca, na crise financeira. Mas há sutilezas na repetida pergunta "como o povo/ indivíduo [parisiense/francês; mineiro/brasileiro] está reagindo?", em lugar da tolice "o que você está sentindo?" que jornalistas vomitam diante do entrevistado que perde tudo, inclusive, e principalmente, a dignidade.
Vejo uma pequena luz no fim do túnel, ainda que muita lama tenha de rolar, para que, nos meandros da comunicação, se evidencie uma mudança de paradigma de nossa sociedade e civilização.