Você sabe esperar, jejuar e pensar?

por Roberto Goldkorn

Há muitos e muitos anos li Sidarta de Hermann Hesse. Como estava iniciando minha fase mística – que dura até hoje – fiquei muito impressionado. O personagem central Sidarta, uma referência direta a Sidarta Gautama (O Buda), me fascinou desde o início.

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Embora a minha memória não possa recuperar a integridade do texto, nem pretendo fazê-lo agora, lembro que Sidarta quando perguntado pelo seu futuro empregador quais eram os seus talentos, respondeu: “Sei esperar, jejuar e pensar”.

Quando li pela primeira vez achei que era poesia pura, uma declaração que só tinha valor dentro de uma perspectiva mística. Mas por algum motivo aquelas palavras ficaram na minha mente.

Hoje olhando para trás, vejo que se tivesse aprofundado mais aqueles três talentos teria obtido mais valor da minha vida. Como todo jovem, fiquei na superficialidade dos termos e perdi a riqueza de suas possibilidades.

Esperar!

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Saber esperar a sua vez, esperar um pouco mais para dizer tudo aquilo que estava engasgado. Esperar que o dia vire noite para então ver se aquela urgência era tão urgente assim.

Esperar é muito mais que ter apenas paciência, é deixar que a fruta amadureça, é exercer um controle consciente sobre os nossos desejos que querem tudo para JÁ! Esperar é ter respeito pelo ciclo natural das coisas, é aguardar que a digestão seja feita e que o aprendizado tenha sido assimilado. Esperar significa não estar sempre pronto para a guerra e responder imediatamente a uma provocação, ou a algo que se pense ter sido provocação. Esperar acima de tudo significa respirar corretamente, e quem respira corretamente não se deixa arrastar pelas emoções.

Ele diz que sabe jejuar! Na época achei que jejum fosse apenas a evitação da comida por um determinado tempo. Como eu estava errado! Jejuar é antes de mais nada resistir as fomes do desejo: comer mais quando estamos saciados, fazer mais sexo quando o que há é apenas tesão. Jejuar é segurar com a mão da consciência desperta as fomes do nosso corpo de desejos. Jejuar acima de tudo é adiar a gratificação dessas pulsões, até que elas tenham perdido o poder de nos escravizar.

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Por fim ele dizia que sabia pensar. Aí você diz: grandes coisas todo mundo sabe pensar. Será?

Quem não sabe esperar e jejuar, não sabe pensar. Se soubéssemos pensar não precisaríamos da Lei para nos coibir os impulsos destrutivos. Não precisaríamos da droga, da bebida, não seriamos nós os lobos de nós mesmos.

Não, a grande maioria de nós não pensa, apenas reage aos estímulos, tanto externos quanto internos – e quando pensa que pensa, está apenas encenando algum modelo cultural pré-instalado. Se pensássemos, valorizaríamos a vida, pois o contrário é dar um tiro no próprio pé uma vez que a vida é uma única teia que nos abriga a todos.

Infelizmente não pude aos 16 anos enxergar além da poesia ou dos significado místicos orientais nas três palavrinhas do personagem de Hermann Hesse. Ou seja, não pensei, nem esperei deixando que as palavras frutificassem na minha mente profunda.

Espero que você possa aproveitar esses três simples talentos e fazer a sua vida valer a pena.