Democracia ameaçada no Brasil? Após três décadas sob o regime democrático, este hoje se mostra frágil e imaturo
Somos um país de regime político democrático há uns 30 anos. Esse tempo é suficiente para que as instituições, típicas de regimes democráticos, se estruturem e funcionem dentro dos parâmetros típicos desse arranjo. Entretanto, isso não aconteceu no Brasil.
O governo atual tem sistematicamente ido ao encontro dessas instituições. Qualquer uma delas que insinue alguma crítica ou apresente sinais de independência e vontade própria é imediatamente objeto de algum tipo de represália. Desde o Supremo Tribunal Federal, passando pelo IBAMA e indo até a Polícia Federal, todas foram ou têm sido vítimas da pressão do governo Bolsonaro.
Apenas para lembrar, todas essas instituições e suas assemelhadas foram criadas visando estabelecer limites ao uso de um poder exclusivo. Elas oferecem parâmetros de contenção, de tal forma que o poder se exerça de maneira prudente e seja contido dentro de uma série de regulamentos estabelecidos pela legislação.
Assim, cabe ao STF verificar se há contradições entre a Constituição Federal e a maneira como o Executivo se comporta, por exemplo. Ao IBAMA cabe zelar pelo meio ambiente, mesmo que isso não seja do interesse de quem está no poder em determinado momento. A Polícia Federal deve cuidar do cumprimento da lei na União, mesmo que isso contrarie interesses pessoais de qualquer ordem. Ou seja, todos esses órgãos fazem parte de um complexo sistema de contenção do uso abusivo do poder.
A democracia no Brasil está ameaçada?
O curioso no Brasil é observar que, a despeito do tempo de estruturação e maturação desses diversos mecanismos, eles patinam no cumprimento de suas funções dentro de um cenário político em que o Poder Executivo não lhes é simpático. Quando o Poder Executivo lhes era claramente simpático, eles funcionavam bem, mas bastou que a situação se alterasse para que sua fragilidade fosse posta à vista.
Sistema democrático não é sólido
Esse sistema de contenção, o sistema democrático, não era sólido. Ele parecia sólido porque o governo da ocasião lhe era claramente simpático. Agora, notamos que nossa democracia é frágil, como se tivesse nascido ontem. Continuamos jovens como sempre. As instituições democráticas, que deveriam estar funcionando a pleno vapor nesse momento, mostram-se inoperantes ou dotadas de uma padrão de operações que contraria sua própria natureza. Elas são coniventes com o poder central. Dado esse histórico, tudo leva a crer que nossas instituições democráticas têm sido coniventes com esse poder. Logo, elas nada têm de democráticas.
Talvez seja o momento de começarmos a refletir, a despeito de nossos interesse pessoal pelo sucesso da democracia, se ela possui efetivas condições de funcionar em um país como o Brasil – e talvez até na América Latina. Cogitar essa possibilidade não é o mesmo que fragilizar a democracia. Isso seria acreditar que a análise e o pensamento fazem muitíssima diferença no mundo prático e, especialmente, nas relações políticas de longo prazo.
Talvez com isso possamos perceber que nossa vocação (nossa capacidade cultural instalada) não inclua a democracia ou somente uma versão muito pouco democrática dela. E talvez isso nos forneça a clareza necessária para postular possibilidades de futuro efetivamente alcançáveis, projetos realmente promissores. Porque, ao que tudo indica, a democracia é um belo sonho europeu desterrado para cá e ainda cheio de saudades de sua pátria.