Como a falta de empatia afeta a relação entre as pessoas

Entenda o conceito de empatia e como a falta dela está relacionada à demência e às doenças neurodegenerativas gerando profundo impacto nas relações familiares, afetivas e sociais

A experiência de se colocar no lugar de outra pessoa é uma habilidade fundamental no repertório do comportamento humano e uma das bases fundamentais para estabelecer vínculos e viver em sociedade. Em outras palavras, a chamada empatia.
Conceitualmente empatia é a habilidade de sentir, compreender e responder a emoções alheias (Hua et al., 2018).

A empatia é composta por duas capacidades: a cognitiva, que envolve a compreensão da emoção e do sentimento alheio e a emocional, que é a experiência de sensibilizar-se e de solidarizar-se com a situação do próximo, segundo Rameson e colegas (2012).

Como seria pensar igual a uma pessoa que você não conhece?

A empatia é explorada de forma criativa no projeto britânico A mile in my shoe (Caminhando com meus sapatos) organizado pelo Emphathy Museum, que inclusive esteve no parque do Ibirapuera, em São Paulo, em novembro de 2017. Nesse experimento a proposta era a de que os visitantes do ‘museu da empatia’ eram convidados a literalmente calçar o sapato de um desconhecido e caminhar por uma milha escutando a sua história pessoal com fones de ouvido. As histórias abordavam diferentes aspectos da vida, como perdas, luto, esperança e amor, envolvendo uma jornada tanto física como empática.

Recentemente, pudemos observar a aplicabilidade da empatia durante a pandemia, quando jovens manifestaram solidariedade aos idosos em isolamento, oferecendo ajuda para compras no supermercado e outras necessidades cotidianas; ou então, em ações de doações de alimentos e refeições aos mais necessitados.

Do mesmo modo, a falta de empatia é também uma experiência subjetiva, mais ou menos evidente, podendo acarretar diferentes prejuízos e consequências.

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Demência e falta de empatia

Os estudos que possibilitam o mapeamento das bases topográficas da empatia no sistema nervoso central foram essencialmente baseados em doenças neurodegenerativas que cursam com degeneração e atrofia seletiva nos lobos frontal e temporal. Seeley (2019) fala do exemplo mais proeminente, que é a variante comportamental da demência frontotemporal, que em estágios iniciais da doença, causa desregulação socioemocional e consequentemente perda da empatia.

Outras condições neuropsiquiátricas podem manifestar-se com redução da empatia em seu curso natural, como por exemplo a esquizofrenia, em casos de transtorno do espectro autista, demência frontotemporal e na sociopatia.

A perda da empatia nesses pacientes se manifesta clinicamente com indiferenças às necessidades e ao sofrimento alheio, gerando um profundo impacto nas relações sociais e afetivas de familiares e cuidadores. A incapacidade de responder a emoções alheias em geral também se mostra evidente através da não modificação na expressão facial.

É importante ressaltar que, mesmo na ausência de patologias neuropsiquiátricas como as já descritas, a empatia não é uma experiência universal, apesar de sua fundamental importância como função adaptativa na evolução humana.

Estudos mostram que pessoas do mesmo grupo étnico, político ou social experienciam mais empatia cognitiva e emocional com seus semelhantes quando comparadas a pessoas que pertencem a grupos distintos, levando a um progressivo distanciamento destes.

O oposto da empatia: indiferença ao sofrimento alheio

Entretanto, vale lembrar que, embora o oposto da empatia seja por vezes referido como ódio ou aversão, ele é, na verdade, a indiferença ao sofrimento alheio, que muitas vezes pode se manifestar de forma mais silenciosa, sem parecer carregar consequências evidentes.

Estudos realizados durante a pandemia sugerem que comportamentos pró-sociais como a empatia influenciam positivamente na adesão a regras sociais e a orientações como o distanciamento social, higiene pessoal e vacinação.

A pandemia evidenciou também a falta de empatia de muitas pessoas saudáveis, especialmente em relação à população de maior vulnerabilidade, ao negarem os cuidados necessários para evitar o contágio. Por outro lado, quando experimentada em demasia, a empatia também pode não ser saudável, já que é capaz de levar a maior fadiga emocional e burnout.

Dessa forma, na vida em sociedade, idealmente buscar-se-ia exercitar e modular a empatia, assim como equilibrá-la em nosso cotidiano.

Precisamos entender melhor a empatia e pensar formas de, quem sabe, melhor desenvolvê-la e estimulá-la. Precisamos falar mais sobre empatia com nossos colegas de trabalho, família e amigos. É preciso levá-la para nossa casa, nossa comunidade local, nossos amigos e familiares e, acima de tudo, para nossos desconhecidos, pois é na relação empática com o próximo que evoluímos como humanidade.

Referência: Aguzzoli CS, Schilling LP. Empatia: redes neurais e comportamentos sociais. In Brain TV magazine. Edição especial/abril 2022

Coordenador do serviço de atendimento a pacientes com tricotilomania no PRO-AMITI/IPq FMUSP. Supervisor clínico na UNIP. Psicólogo pela Universidade Metodista. Mestre em ciências pela Faculdade de Medicina da USP. Especialização em Terapia Cognitivo-comportamental pelo Ambulim/IPq FMUSP. Especialização em Psicologia Hospitalar pela UNISA