Como largar longo vício de cocaína?

Ainda não há medicações comprovadamente eficazes para largar vício de cocaína, mas há outros manejos de tratamentos que podem ser aplicados; saiba

E-mail enviado por um leitor:

“Uso cocaína há cinco anos. O que posso dizer sobre mim? Entrei num estágio em que começo a definhar. Objetivamente, o que preciso fazer para sair disso?

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Resposta: Em 2017, a taxa de consumo de cocaína/crack foi estimada em 2.2% na população brasileira e, dentre os usuários, cerca de 41% podem estar dependentes da droga (UNIAD, 2018). Dados os fortes sintomas da síndrome de abstinência provocados pelo uso continuado de cocaína/crack, a quebra do ciclo do consumo torna-se problemática.

Efeitos da cocaína

A cocaína consiste em uma molécula com peso molecular relativamente baixo e com grande facilidade para penetrar nos tecidos gordurosos (substância lipofílica). Logo, a entrada dessa substância no Sistema Nervoso Central é veloz e com efeitos quase imediatos. Dentre estes efeitos podemos citar:

a) Euforia;
b) Sensação de aumento da energia;
c) Aumento da excitabilidade (inclusive sexual);
d) Diminuição drástica do apetite;
e) Ansiedade;
f) Insônia:
g) Sensação de estar sendo vigiado;
h) Alucinações;
i) Taquicardia, pupila dilatada, aumento da pressão arterial;
j) Náuseas/vômitos;
k) Dor no peito, fadiga;
l) Convulsões.

Por que as pessoas consomem cocaína?

Grande parte dos usuários de cocaína inicia o consumo por curiosidade, embora aqueles que decidem experimentá-la procuram atingir um estado de alta euforia e bem-estar. Apesar de muitos dependentes da droga reportarem que eles nunca conseguiram obter a mesma sensação atingida durante o primeiro uso da substância, existem evidências de que o típico usuário de cocaína tem consistente sensação de prazer durante as demais “experimentações”.

As taxas de recaída entre os portadores de problemas relacionados com o consumo de cocaína/crack têm sido apontadas como altas, principalmente quando comparadas a outros tipos de substâncias psicoativas. Isso significa que o dependente de cocaína/crack pode precisar, no decorrer da sua dependência ativa, de diferentes formas de manejo terapêutico para alcançar a tão esperada abstinência completa.

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Quanto mais tempo uma pessoa tem usado essa substância, mais difícil torna-se a interrupção do consumo. Embora até o presente momento não existam medicações comprovadamente eficazes para o tratamento da síndrome de dependência da cocaína, há uma miríade de outros manejos ou formas de tratamento que pode ser aplicada.

Tratamentos para largar cocaína

O processo de desintoxicação é usualmente supervisionado por equipe interdisciplinar, com o profissional médico sempre presente. Muitos programas de tratamento incluem terapia individual, terapia de família e grupos de mútua ajuda ou de aconselhamento, procurando desenvolver no dependente habilidades comportamentais e cognitivas para evitar situações de risco bem como modificar o seu corrente estilo de vida.

Os programas de tratamento devem ser individualizados, visto que a população que padece deste problema é extremamente heterogênea. O princípio “one size does not fit all” deve ser sempre considerado. Por exemplo, além de disponibilizar fórmulas respaldadas de manejo clínico para a Síndrome de Dependência de Cocaína, a equipe interdisciplinar especializada poderá propor ao paciente estratégias ainda mais individualizadas, tais como reabilitação profissional, aconselhamento quanto à carreira profissional, estímulo para desenvolver uma rotina de atividades físicas supervisionadas, dentre outras.

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O primeiro passo é procurar tratamento especializado

Procurar tratamento médico e psicossocial especializado é o primeiro grande passo para mudar a sua história. Persistir no tratamento, seguir todos os passos e metas estabelecidos pela equipe juntamente com você, identificar situações “gatilho”, desenvolver habilidades sociais e laborais…, comumente são outros passos em direção ao sucesso.

O fato de não existirem medicações comprovadamente eficazes para o manejo desta condição não significa que alguns fármacos não devam ser utilizados para o controle de sintomas comumente presentes, como ansiedade, depressão e impulsividade. Por isso, o tratamento deve ser interdisciplinar.

Também, reitero aqui, o tratamento é uma via de mão dupla. Há a necessidade de uma equipe preparada e disposta bem como de um paciente disposto a melhorar e cessar o consumo dessa perniciosa substância.

Muitas vezes, a busca por ajuda especializada pode ser vista pelo usuário problemático como vergonhosa ou embaraçosa, dado o estigma social relacionado com a dependência de drogas. De qualquer forma, até mesmo se você não puder ou não conseguir confiar nos seus amigos ou familiares, é imperativa a procura por tratamento.

Lembre-se: o uso continuado da cocaína poderá trazer-lhe imensas consequências negativas, tanto para a sua saúde física e psicológica, quanto para a sua saúde social e financeira.

Quem está definhando: passos de como largar cocaína

Você afirma estar “definhando” com a sua dependência. Dessa forma, como você mesmo propôs, aponto abaixo os principais passos que você deverá seguir:

a) Procure ajuda especializada;
b) Avalie o seu próprio estilo de vida e identifique fatores ambientais, pessoais e sociais que podem ter colaborado para este “definhamento”;
c) Deixe as mentiras de lado;
d) Junto com o seu médico, procure examinar a melhor forma de tratamento.

No geral, o tratamento ambulatorial tem sido eleito como o preferencial. No entanto, a modalidade de tratamento sob regime de internação em clínicas especializadas pode ser bastante útil, quando bem indicada.

Muitas vezes, o portador de problemas relacionados com o uso de cocaína/crack não consegue diminuir nem tampouco cessar o uso, quando em tratamento ambulatorial. Neste caso, com o objetivo de impossibilitar o acesso à droga, o tratamento sob regime de internação pode ser essencial.

Não perca tempo!!!

Atenção!
Esta resposta (texto) não substitui uma consulta ou acompanhamento de um médico psiquiatra e não se caracteriza como sendo um atendimento.

Professor Livre-Docente pelo Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Professor de Psiquiatria do Centro Universitário Faculdade de Medicina do ABC. Pesquisador nas áreas de Dependências Químicas, Transtornos da Sexualidade e Clínica Forense.