Entenda a tricotilomania

por Ana Beatriz Silva

Vocês se lembram do Capitão Caverna? Coberto por aquela infinidade de pelos desgrenhados e maltratados, com aspecto 'eletrizado', certamente o Capitão Caverna não tinha tricotilomania, pois se tivesse enxergaríamos algumas falhas naquela 'maçaroca' toda.

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A característica essencial da tricotilomania (esse nome tão estranho e complicado) é o desejo ou impulso incontrolável de arrancar fios ou tufos de cabelo.

Muitas vezes, esse comportamento pode se tornar tão automatizado que a pessoa age inadvertidamente, sem se aperceber dele. Pode se tornar tão grave a ponto de a pessoa ficar com extensas falhas no couro cabeludo, sobrancelhas ou cílios. Arrancar fios de cabelo de outros locais, como barba e pelos pubianos, são ocorrências bastante incomuns.

A atitude de arrancar fios em si já seria bastante estranha (e quem sofre de tricotilomania tem completa consciência da estranheza do próprio comportamento), mas, após arrancar os fios, muitas pessoas com esse transtorno ainda se engajam em comportamentos como alisar os fios, enrolando-os entre os dedos, passando por entre os lábios e brincando com eles de maneira geral. Mais raramente, algumas chegam a comer as raízes dos fios ou mesmo a engoli-los, o que pode até levar à necessidade de cirurgia para a retirada dos bolos de fios que se formam.

Causa

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Não se sabe ao certo o que causa a tricotilomania, mas certamente o fator biológico e hereditário é predominante, em razão de sua grande ocorrência em famílias em que um dos membros já teve TOC (transtorno obsessivo-compulsivo), ou algum transtorno do espectro TOC.

Cabe aqui uma pequena explicação do que vem a ser esses transtornos comportamentais, acima citados. O TOC é um transtorno psiquiátrico, conhecido popularmente como manias e que causa extremo sofrimento ao portador. Caracteriza-se por pensamentos obsessivos e intrusivos, sempre de natureza ruim, como pensar exaustivamente que irá se contaminar ou que um ente querido morrerá, por exemplo. Na tentativa de aliviá-los, o portador adota comportamentos compulsivos e incontroláveis (rituais), tais como lavar as mãos e tomar banho várias vezes ao dia, mania de limpeza, de arrumação, de deixar tudo simetricamente organizado, checar várias vezes as trancas das portas, entre muitos outros, o que gera mais angústia e constrangimentos, pois são comportamentos perceptíveis aos olhos dos outros.

Já os transtornos do espectro TOC, como a mania de arrancar o cabelo (tricotilomania), lembram muito o TOC, mas que não se configuram neste transtorno propriamente dito. Muitas características são semelhantes, como sintomas, idade de início destes, curso ou evolução clínica, origem, história familiar, modo de transmissão genética, semelhança e respostas positivas quanto ao tratamento, mas na verdade são alterações de comportamento que se constituem em uma entidade clínica independente por si só.

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Em geral a tricotilomania começa na infância ou na adolescência. Na prática clínica temos notado que muitos adolescentes começam a puxar os cabelos assim que percebem que a qualidade e a cor dos fios mudaram em razão das alterações naturais da adolescência. Isso é mais comum entre as meninas, que dizem não se conformar que o cabelo tenha ficado mais grosso, mais ondulado ou mais escuro. Assim, algumas se esmeram em catar fios destoantes do resto do cabelo. Usam o tato para sentir a textura dos fios ou ficam observando no espelho até detectar fios não assentados, crespos ou com qualquer outra característica que fuja ao padrão por elas desejado.

O ato de puxar os fios costuma ser precedido de duas situações curiosamente opostas entre si: ou uma situação de aumento de estresse, que cause ansiedade e nervosismo, ou situações tranquilas, de contemplação, em que a pessoa não tenha nada de imediato para fazer e fique pensando. Nestas últimas, com frequência a pessoa começará puxar os fios distraidamente.

Esse problema ganha contornos dramáticos porque causa danos à auto-estima das pessoas e muitas vezes também à sua estética. É comum que deixem de sair de casa, passem a usar bonés e evitem ir à praia, piscina ou se dedicar a quaisquer outras atitudes em que se exponham as falhas do couro cabeludo.

O tratamento, prolongado e difícil, envolve a necessidade de ganhar maior controle sobre os próprios impulsos por meio de medicamentos e psicoterapia de abordagem cognitivo-comportamental (Terapia cognitivo-comportamental – TCC), o que sempre vem após bastante esforço e perseverança.

Entenda a tricotilomania

por Edson Toledo

Você certamente ja ouviu a música intitulada "Cabelo" magistralmente cantada por Gal Costa?

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Se não, eis a segunda parte da música onde Gal canta:

"[…] Cabelo, cabeleira, cabeluda, descabelada
Quem quer a força de Sansão
Quem quer a juba de leão
Cabelo pode ser cortado
Cabelo pode ser comprido
Cabelo pode ser trançado
Cabelo pode ser tingido
Aparado ou escovado
Descolorido, descabelado […]"

Para alguns desavisados e desatentos que podem não estar entendendo por que estou escrevendo sobre cabelo, já que esta coluna intitula-se "Mente e Você". Elementar meu caro leitor!

É que existe um transtorno psiquiátrico que se chama tricotilomania. Isso mesmo, tricotilomania e esse nome difícil de pronunciar deve-se à sua origem grega que quer dizer mania de arrancar cabelo.

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Você leu certo, pessoas que arrancam não só cabelo, mas qualquer pelo corporal (cílios, sobrancelhas, região genital, axilas, barba, abdome e membros) ao ponto de deixarem falhas perceptíveis pode estar sofrendo de tricotilomania e isso não é "frescura" ou sem-vergonhice como muitos acham.

Na nossa prática clínica os pacientes relatam fortes sentimentos de vergonha e embaraço e muitos tentam disfarçar a perda de cabelo usando perucas, fazendo penteados especiais, maquiagem, usam bonés/chapéus, lenços ou mesmo raspam todo o cabelo como forma de controle. Relatam ainda forte senso de isolamento social, evitando diferentes atividades como nadar, dançar, exercitar, praticar esportes, locais onde a perda de cabelo possa ser exposta, sem falar de evitarem situações afetivas íntimas. O pior é que esses comportamentos podem contribuir para retardar a procura por tratamento.

Esses episódios de arrancar cabelo podem ocorrer em qualquer lugar e situações como ao ler, assistir televisão, falar ao telefone, dirigir, digitar no computador ou deitar na cama e relatos dizem que podem durar de alguns minutos até horas.

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Os pacientes com tricotrilomania informam, em geral, preferência por fios com textura ou qualidades diferentes (por exemplo: grosso, crespo, espetado, branco, desalinhado), e alguns tiram de maneira ritualística.

Alguns estudos apontam que quase metade dos pacientes depois de arrancar o cabelo se ocupará de comportamentos orais como passar os fios entre os lábios, morder ou arrancar a raiz e mesmo comer o cabelo/pelo ou parte dele.

O comportamento de comer o cabelo/fio é chamado de tricofagia e a ingestão pode conduzir a consequências mais graves como o desenvolvimento do *tricobezoar gástrico intestinal e quando essa condição acontece sua retirada é cirurgica. Por fim, a síndrome do tunel do carpo (essa sindrome quase sempre é a causadora da conhecida lesão por esforço repetitivo ou LER) pode acontecer devido ao persistente movimento de arrancar cabelo, o paciente também pode apresentar infecções de pele na região arrancada principalmente quando se utiliza pinça para arrancá-lo, e frequentemente apresenta ansiedade e depressão como transtornos associados.

Você a essa altura deve estar se perguntando: nossa essa tal tricotilomania parece ser grave mesmo, mas tem tratamento?

E respondo que sim, caro leitor! O tratamento deve ser preferencialmente com medicação e psicoterapia, assim um médico psiquiatra e/ou psicólogo clínico deve ser consultado para que seja feito um diagnóstico preciso e decidir qual é a melhor estratégia terapêutica. Quase sempre a utilização das duas abordagens deve ser empregada.

Quanto à medicação, antidepressivos serotoninérgicos são os mais utilizados até o momento, porém estudos recentes têm utilizado a n-acetilcisteina (que não é um psicofarmaco e não tem efeito colateral) em doses altas com bons resultados em estudos controlados. No que se refere à abordagem psicoterapeutica o treinamento da reversão do hábito, que é um tratamento que combina técnicas comportamentais, é citado como um tratamento com bons resultados. Entretanto, a terapia cognitivo-comportamental (também conhecida por TCC), abordagem que enfoca as cognições disfuncionais (padrões de pensamento), comportamentos (ações) ou emocionais (sentimentos) que levam, nesse caso em específico, a causar danos à pele ou ao cabelo/pelo tem oferecido uma perspectiva nova e mais realista para o comportamento de arrancar cabelo.

Por fim, digo que a evolução dos quadros da tricotilomania ainda é pouco conhecida, embora a maior parte das populações clínicas acompanhadas apresente curso crônico sem remissão completa.

Aparentemente, um melhor ou pior prognóstico depende da idade de início do quadro, da área comprometida e da **comorbidade associada.

Bem… fica aí o meu breve alerta sobre a tricotilomania. Até o próximo encontro.

* Tricobezoar: acúmulo de pelos ou cabelos dentro do estômago.

** Comorbidade: o termo é formado pelo prefixo latino "cum", que significa contiguidade, correlação, companhia, e pela palavra morbidade, que é a capacidade de produzir doença.

Entenda a tricotilomania

por Ana Maria Costa

É  o ato de puxar constantemente os próprios cabelos por prazer, gratificação ou alívio de tensão, acarretando uma perda capilar perceptível. A tricotilomania é caracterizada como um Transtorno do Controle do Impulso e  trata-se de uma doença psiquiátrica.

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A pessoa que pratica esse ato refere (relata) uma sensação de tensão crescente imediatamente antes de arrancar os cabelos ou quando tenta resistir a esse comportamento.

A tricotilomania não se restringe a arrancar cabelos da cabeça, também é relatado o comportamento de arrancar sobrancelhas, cílios, pelo do abdômen e regiões púbicas.
Tricotilomania ocorre mais em mulheres

Esse distúrbio causa sofrimento significativo com prejuízo no funcionamento social onde as pessoas passam a ter vergonha de se expor devido às falhas de cabelos ou ocupacional onde deixam de trabalhar devido ao aspecto impactante que passam a ter.

Sofrimentos orgânicos também são identificados, onde o ato de arrancar cabelos pode vir juntamente com o comportamento de passar os fios nos dentes ocasionando erosão dental, ou ainda, o ato de engolir os fios arrancados pode causar sérios danos no trato digestivo, necessitando acompanhamento médico e /ou intervenção cirúrgica.

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As pessoas que sofrem desse distúrbio necessitam de tratamento especializado, para que possam controlar esse impulso. Por vezes é necessário tratamento psicológico e psiquiátrico através de terapia e medicação.

Esse distúrbio é mais frequente em mulheres do que em homens e a ciência ainda não descobriu uma resposta específica para isso. Só é possível afirmar que as mulheres procuram mais o tratamento.

A idade mais comum para o aparecimento da tricotilomania é por volta dos 13 anos quando ocorre a menarca (1ª menstruação).

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Alguns fatores podem ajudar a desencadear o distúrbio como:

– Mudança de escola;

– Separação dos pais;

– Isolamento de amigos;

– Traumas;  

– Diante da ansiedade e da dificuldade em expressar os sentimentos algumas pessoas realizam atos para diminuir a tensão e a tricotilomania pode ser um desses;

– Também colabora para o surgimento do distúrbio a presença de parentes com esse problema ou momentos de depressão que a pessoa esteja vivendo.

SERVIÇO:

Onde procurar ajuda – tratamento gratuito

PRO-AMITI – Serviço do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

R. Dr. Ovídio Pires de Campos, 785 – São Paulo – SP – Brasil – CEP 01060-970
+ 55 11 2661-7805