Fama precoce: possível fardo na vida adulta

Por Mario Louzã  

Drew Barrymore encantou o mundo no clássico “E.T. – O Extraterrestre”, com apenas 5 anos, o que levou a ser uma das mais conhecidas atrizes-mirins de Hollywood. Aos 9, passou a fumar, beber e, com 13 anos, já se tornara viciada em cocaína. Durante sua reabilitação, aos 14, tentou o suicídio.

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Justin Bieber tinha 15 anos quando se tornou um ídolo da música teen. Aos 20, foi preso por dirigir sob a influência de drogas, e em alta velocidade. No mesmo ano, em 2014, foi acusado de vandalismo por seu vizinho.

Haley Joel Osment, inesquecível em seu papel no filme “O Sexto Sentido”, chegou a concorrer, com 11 anos de idade, ao Oscar de Melhor Astro Coadjuvante. Em 2006, foi preso por dirigir embriagado, e passou por reabilitação.

Esses são alguns dos muitos casos de pessoas que alcançaram o estrelato na infância/pré-adolescência, mas acabaram sucumbindo na vida adulta. Afinal, por que isso acontece?

Se adultos têm dificuldade para lidar com a fama, o que dizer das crianças? Os atores e cantores mirins, os netos e bisnetos da rainha da Inglaterra, e até os filhos de famosos; terão, necessariamente, que enfrentar a exposição à mídia, a fama, a posição de destaque em relação às demais crianças.

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Lembremo-nos da mitologia grega: pouco antes de nascer, os pais de Narciso consultaram um oráculo para saber o destino do menino. Este advertiu que teria vida longa, desde que não visse seu próprio rosto. O menino, dotado de beleza incomum, era tão atraente que muitos se encantavam por ele. No entanto, era também muito orgulhoso e prepotente. A ninfa Eco, que se apaixonou por ele, foi rejeitada, e pediu aos deuses do Olimpo que vingassem sua rejeição. Estes o condenaram a mirar seu próprio rosto na superfície de um lago. Imediatamente, Narciso se apaixonou por si mesmo, e acabou morrendo, pois não conseguia deixar de olhar seu reflexo.
Todos nós temos uma certa “dose” de narcisismo (nossa autoestima), necessária para o desenvolvimento. Esta é contrabalançada pela própria realidade, que nos apresenta informações que permitem que nos avaliemos e tenhamos uma noção mais real de quem somos de fato (em geral, aquém do que gostaríamos de ser, nosso narcisismo).

Uma criança famosa terá que lidar com o fato de ser reconhecida e admirada por todos, ao mesmo tempo, que deve cumprir todas as etapas da vida de qualquer outra criança (escola, esportes, aulas extracurriculares etc). Se ficar muito deslumbrada consigo mesma, corre o risco de se tornar insuportável o convívio com ela, passando a ser sistematicamente ignorada por outras crianças ou até por adultos.

Muitas vezes, a fama dura apenas um determinado período. Logo, essas crianças deixam de ser interessantes, até porque crescem e podem perder a graça que tinham quando mais novas. Daí vem o sentimento de abandono, indiferença, algo do qual elas não estão acostumadas. Nessa circunstância, a pessoa pode desenvolver problemas mentais e emocionais.

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A preocupação com a situação do trabalho infantil (seja ele artístico ou num canavial) está refletida na lei brasileira. Nossa legislação trabalhista, a rigor, proíbe que menores de 16 anos trabalhem, exceto como aprendizes a partir dos 14 anos. Já o Estatuto da Criança e do Adolescente (Artigo 149) dispõe sobre o trabalho artístico de menores, com o objetivo de evitar os excessos dessa atividade.

Uma criança exposta à mídia, de modo sistemático, deve ter um acompanhamento especializado psicoterápico para que tenha um canal de conversa e possa lidar com o bônus e o ônus da fama. Com isso, teria uma chance maior de escapar das armadilhas do narcisismo, de uma autoestima tão elevada, de um deslumbramento tão grande consigo mesma e dos transtornos mentais que tudo isso pode proporcionar.
 

Fonte: Por Prof. Dr. Mario Louzã, médico psiquiatra e psicanalista. Doutor em Medicina pela Universidade de Würzburg, Alemanha. (CRMSP 34.330)