por Roberto A. Santos
Neste décimo artigo da série sobre os descarriladores de carreira,vamos abordar aquele tipo mais flexível do que elástico velho, pelo menos para se ajustar ao que seu chefe está dizendo. O Obsequioso busca resolver seus problemas fazendo alianças sobretudo com as pessoas que detêm o poder.
Há muitos anos, havia um quadro de um programa humorístico do Jô Soares (quando ele era engraçado…), em que seu personagem Múrcio, fazia todas as manobras possíveis verbais e não verbais para concordar com seu chefe. Suas opiniões mudavam de direção, sentido, cor e intensidade, tantas vezes quantas fossem necessárias para reafirmar seu total apoio a seu amado chefe, com o refrão: "Tirou daqui ó!", ou seja, da ponta de sua língua. Mesmo que tivesse acabado de falar exatamente o oposto.
Nosso "Múrcio" de cada dia busca conchavos para evitar confrontos. Dessa maneira, ele procura garantir sua segurança, acomodando-se e flexibilizando suas opiniões e crenças, até o ponto de não saber mais em que ele realmente acredita em seu íntimo.
Se você tem um obsequioso como chefe, provavelmente deve se ressentir de que a grama do vizinho seja mais verde. Ou seja, o pessoal do departamento ao lado tem um chefe louco que briga pelas reivindicações de sua equipe, no limite de seu próprio emprego. Enquanto que seu "chefinho" está sempre bem com os homens lá de cima, mesmo que se for para deixar seu pessoal na maior dureza.
Mesmo quem não é chefe de ninguém pode descarrilar por esse atalho que parece tão seguro. Ao revelar-se dependente e inseguro, sempre aguardando a confirmação de seu superior de que está no caminho correto, nosso vulgo "capachinho" pode se dar bem enquanto tiver pela frente um bom par de pés pisadores.
Entretanto, se o Obsequioso (a) se deparar com um gestor que gosta que as pessoas pensem, que tenham idéias próprias e falem sem hesitação o que estão pensando, ele pode estar correndo o risco iminente de virar poeira.
Puxa-sacos, em sua origem, eram os ordenanças que no Exército carregavam os sacos de roupas dos oficiais, provavelmente mesmo contra sua vontade. Alunos aplicados que fazem favores para a professora e funcionários sempre prontos a carregar qualquer saco – mudam-se os termos e os cenários mas a tendência de se garantir a aprovação e vantagens de superiores é a mesma e se fundamenta em características obsequiosas e dependentes da personalidade.
Nosso amigo Múrcio se protege numa zona de conforto, muitas vezes garantidas por chefes narcisistas que adoram se cercar por aqueles que acatam qualquer baboseira que sejam capazes de emitir. Portanto, se ele conseguir escolher seu chefe, pode ser que se preserve eternamente numa organização, mas se ele viver na realidade que a maioria conhece de imprevisibilidade crescente, então é melhor estar preparado para todos tipos de gestores.
Então, seguem algumas sugestões, caso você se enquadre no tipo que concorda em dez dentre dez emissões que seu magnífico líder profira:
Será que o risco é tão grande?
O verdadeiro temor do Obsequioso são as conseqüências que crê advirão de qualquer discordância do ponto de vista de seu superior – infalível como todos imortais. Porém, antes de se abater pelo medo da rejeição, ele ou ela deveria refletir sobre o pior cenário. "Se eu discordar do irrepreensível chefe será que perderei meu emprego?", ou "Já aconteceu o mesmo em situações semelhantes, comprovadamente?", ou ainda, "Será que terei apenas que estar bem preparado para fundamentar com segurança minha opinião arrojadamente contrária ao grande sábio?".
Provavelmente, se você costuma descarrilar por aqui, você provavelmente tenderá a acreditar que o risco sempre será maior do que na realidade seria de se supor. Meça e avalie os riscos, inove, contrarie, contradiga mas sempre pronto para argumentar seu ponto, e você poderá descobrir um novo mundo, em que suas verdadeiras opiniões sejam valorizadas.
Quais são minhas crenças inegociáveis?
Todos nós temos um campo de negociação em nossas crenças e opiniões, em qualquer tema da vida. Podemos ser muito flexíveis quanto à cor de da camiseta que vamos escolher para a festa de final de ano e inflexíveis quanto à definição de um critério único para avaliação de desempenho entre diferentes departamentos. O problema do obsequioso é sua tendência de flexibilizar praticamente tudo para todos que tenham alguma ascendência sobre ele. Assim, sua credibilidade entre os colegas e com os próprios superiores acaba drenando para um mar gelatinoso de obviedades inúteis e inconsistentes.
Sempre o equilíbrio é que mantém uma carreira nos trilhos. O desafiador contumaz apenas para provar-se capaz de enganar ao maior número de incautos e o obsequioso que tudo aceita são extremos que provocam derrapadas incontroláveis. Quando nosso "Múrcio" se arrisca e contradiz seu chefe com suas próprias idéias, ele corre também o risco de salvar o próprio chefe de um desastre – e isso pode lhe fazer muito bem!