Por Aurea Caetano
Na época da Copa do Mundo, muito foi falado a respeito do campo: a entrada em campo, a bola em campo, o campo do adversário, a demarcação do campo e por aí. Afinal, não há jogo se não houver um campo definido, com contornos, no qual os jogadores ou seus participantes possam se movimentar conhecendo seus limites. Um jogo, seja ele qual for, depende da existência de um e outro time, de um e outro lado e de um espaço no qual ele possa acontecer. Sem a possibilidade de um acordo ou combinação prévios não há jogo; data, horário, localização… Isso tudo deve ser combinado ou acordado para que um jogo aconteça.
E para que um jogo possa de fato ocorrer, é importante que todos os participantes, a equipe, os dois times, os dois jogadores, estejam de fato comprometidos com ele; ou não será um jogo verdadeiro, será um jogo “café com leite”. E o que é “estar comprometido”? É no mínimo entrar em campo para valer, estar inteiro, dar o melhor de si (como costumam dizer os jogadores de futebol nas entrevistas), utilizar todas as jogadas treinadas, toda a habilidade criativa, toda a capacidade empática. É poder saber seu tamanho e perceber qual o tamanho do outro, é poder jogar a partir de todo seu treinamento, de suas qualidades podendo reconhecer o outro jogador e perceber qual a jogada mais efetiva naquela partida. Um bom jogo não precisa ter, necessariamente, um vencedor, mas precisa ser, com certeza, uma boa partida. A audiência valoriza o jogo em si e percebe o valor de uma partida bem jogada, e isso faz toda a diferença, faz valer a presença e o preço do ingresso.
O mesmo se dá com nosso trabalho em psicoterapia. Para que um trabalho analítico possa acontecer é necessária a construção de um campo adequado no qual o encontro analítico e os processos que serão desenvolvidos a partir dai possam ter seu lugar e espaço. E o que é, para nós, esse campo?
Do ponto de vista objetivo é preciso delimitar o lugar do encontro analítico. Pensando no processo clássico este seria o espaço no qual o terapeuta trabalha, seu consultório, sua sala de atendimento, o lugar no qual realiza sua “obra” ou seu jogo. Espaço de referência, setting analítico, tão parte do processo como os próprios participantes ou jogadores. E estes dois jogadores devem poder ocupar seus respectivos espaços no campo do jogo ou do encontro e jogar uma partida bonita, um bom jogo.
Assim como em qualquer relação, o que se espera é que tanto terapeuta quanto paciente deem o melhor de si, estejam inteiros, e que possam se entregar ao jogo, com todas suas capacidades e expertises, cada um de seu lado do campo. Só assim, o jogo terapêutico poderá vir a ser um bom jogo!