Relação abusiva: sim ou não? As explosões de ira e raiva, por si só, não são capazes de dar uma resposta clara para essa questão.
E-mail enviado por uma leitora:
“Todos nós temos o nosso lado sombra, o nosso lado negro, aquele monstrinho oculto, que de vez em quando pode vir à tona, nos tornando irascível… Isso é normal, é do ser humano e até nos torna mais humanos. Mas há uma linha que possa delimitar se foi só um rompante de ira ou se estou prestes a entrar em uma relação abusiva? É possível separar o joio do trigo? Se puder me orientar fico contente. Muito obrigada.”
Resposta: Esbravejar, gritar, perder a calma são formas de expressar frustrações e desconfortos afetivos. Mas não podemos esquecer que nem todas as pessoas expõem seus sentimentos dessa forma. Muitas, simplesmente, engolem suas frustrações e quem está ao seu redor nem percebe…
Qual o limite para explosões decorrentes de frustrações não expressas?
Assim, talvez valha a pena reformular sua pergunta levando em conta não só qual o limite para explosões decorrentes de frustrações mas questionando também qual o limite e as consequências de acumular frustrações não expressas…
Certamente o equilíbrio é sempre a melhor resposta. Mas nem sempre isso é possível
As explosões de ira e raiva, por si só, não são capazes de sinalizar se uma relação é abusiva ou não. Muitas vezes temos pessoas que não explodem constantemente mas guardam suas frustrações até não aguentar mais e colocar tudo para fora de uma vez. E, talvez, essas sejam as mais perigosas, as que levam o abuso a suas últimas consequências podendo até matar.
Existem casais que são mais viscerais e explodem por qualquer coisa. E, por mais paradoxal que possa parecer, essas explosões podem adquirir um sentido de familiaridade, de confirmação; casais que vivem brigando e se agredindo para depois fazerem as pazes e reafirmarem a relação. E não podemos dizer que existe aí uma relação de abuso aí. Essa é apenas a forma que eles escolherem para alimentar a visceralidade da qual necessitam.
Outros casais escondem tanto seus sentimentos, que uma hora acabam por criar um distanciamento tão grande entre eles que o relacionamento se rompe. Há abuso aí? Não necessariamente. Embora muitas vezes a distância possa machucar mais do que um tapa…
Então, como identificar uma relação abusiva e se proteger dela?
Em geral, as relações abusivas começam com uma atitude muito sedutora por parte do abusador. Explosões, como nossa leitora conta acima, raramente fazem parte do comportamento do abusador. Pelo menos no início do relacionamento. Se assim fosse, seria bem mais fácil a vítima identificar uma pessoa perigosa.
O abusador, em geral, consegue manter um controle emocional para aprisionar a vítima; vai tecendo uma teia na qual a vítima, quando percebe, já se enredou. Assim, para perceber um abuso, é importante avaliar sensações internas sentidas por quem está se relacionando com o abusador. Essas sensações, em geral, são ambíguas e contraditórias; ao mesmo tempo em que quer acreditar no amor e nas boas intenções do abusador, a vítima se sente desconfortável, presa, angustiada. Quando percebe, já se entregou a ponto de permitir que o abusador a chantageie.
Mas isso pode ocorrer em quase todos os relacionamentos afetivos, dirá a leitora. Sim, o jogo de poder é uma característica do relacionamento amoroso. Mas um poder alternado, ora nas mãos de um, ora nas mãos de outro. No relacionamento abusivo o poder é estático, sempre nas mãos de quem abusa, com raríssimas exceções.
Num relacionamento saudável o poder não é o primeiro objeto de desejo. O que o define são planos em comum, empatia, respeito ao outro, paciência e sensibilidade. Assim, para saber se está no caminho certo, o casal tem que se esforçar para saber qual é sua hora de ceder e qual é a hora de lutar pelas suas convicções. Nenhum relacionamento nasce pronto. E, em geral se constrói passo a passo. E quando algo dá errado, é importante tentar consertar logo, antes que um simples errinho abale toda a estrutura. Em qualquer construção que se preze.
Atenção!
Esta resposta (texto) não substitui uma consulta ou acompanhamento de uma psicóloga e não se caracteriza como sendo um atendimento.