Cadeia, casa psiquiatra, caixão: assustar o jovem sobre as consequências do consumo de drogas funciona? O que pode proteger o jovem de não experimentar uma droga?
Pergunta de uma leitora:
“Sou mãe de um filho adolescente que está usando álcool e maconha. Estou desesperada e procurando na internet sobre o assunto. Vi que viciados em drogas terminam em 3Cs: cadeia, casa psiquiátrica, caixão. Isso me deixou mais apavorada ainda. Mas será que se começar a bater nessa tecla com o meu filho, ele pode ficar com medo e largar o álcool e a maconha?
Resposta: Infelizmente, eu ainda tenho ouvido esta tríade a respeito das possíveis consequências do uso de substâncias psicoativas como uma tentativa de demover o jovem da ideia de iniciar e/ou manter o consumo das mesmas. O mais infeliz é que, às vezes, eu ainda ouço essa tríade da boca de profissionais da saúde. Líderes políticos usualmente apreciam a ideia de prevenir o uso de drogas entre os jovens “assustando-os”, uma estratégia na qual já foram gastos milhões de dólares, especialmente nos Estados Unidos da América.
Cadeia, casa psiquiatra, caixão: assustar o jovem não funciona
O problema é que, de um modo geral, programas baseados em “assustar” não funcionam.
Relatórios da Open Society Foundations sobre prevenção ao uso problemático de substâncias psicoativas têm detalhado um grande conjunto de pesquisas mostrando que os programas que visam a manter os jovens abstinentes, especialmente exagerando os danos provocados pelas drogas, são irrealistas e podem até ser contraproducentes. Quando o principal objetivo da prevenção é “assustar” os jovens, almejando o afastamento das drogas, perde-se a oportunidade de ajudá-los a saber como se proteger dos malefícios das drogas.
Nos Estados Unidos da América, um programa escolar de prevenção de drogas chamado D.A.R.E. (Drug Abuse Resistance Education) foi implementado em 1983 em cerca de 80 por cento dos distritos escolares em todo o país. Com abundante financiamento do governo, o programa centrou-se na mensagem “apenas diga não”. Este programa retratava todas as drogas como imediatamente perigosas. Todavia, pesquisas paralelas e independentes descobriram que isso não levou às taxas de abstinência significativas ou mesmo ao adiamento do primeiro uso de drogas entre os jovens.
Os Estados Unidos também investiram pesadamente em um grande programa de mídia de massa sobre os perigos do uso de drogas com o objetivo de promover a abstinência, conhecido como Campanha Nacional Antidrogas para a Juventude. Uma avaliação revisada por pares desse esforço descobriu que não reduziu ou atrasou o uso de drogas e, de fato, pode ter influenciado negativamente alguns jovens mais curiosos para experimentar maconha, porque alguns dos anúncios davam a impressão de que “todo mundo” estava fumando maconha.
Jovens tendem a não acreditar em exageros
Para outros programas orientados para a abstinência que, por exemplo, tentam assustar os jovens sobre os danos causados pelo uso de drogas, as avaliações independentes do governo descobriram que os jovens tendiam a não acreditar nos exageros. Eles veem seus pares experimentar drogas sem ter suas vidas arruinadas, seus dentes caírem ou seus cérebros debilitados, e a mensagem de prevenção baseada no medo sobre o perigo imediato não soa verdadeira.
Talvez aprendendo com essas experiências, especialistas de todo o mundo têm enfatizado outros objetivos dos programas de prevenção de drogas. Além disso, especialistas acadêmicos, a Organização dos Estados Americanos, a União Europeia e o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime endossam programas de prevenção de drogas que sejam baseados em evidências científicas que produz bons resultados. De fato, fantasiar sobre um mundo livre de drogas é ingênuo demais.
A própria Comissão de Narcóticos da ONU, que muitas vezes se entregou às fantasias de um “mundo livre de drogas”, em 2014 aprovou uma resolução observando que os programas de prevenção ao uso de substâncias muitas vezes não são suficientemente submetidos às avaliações de pesquisadores independentes e deveriam ser rigorosamente baseados em evidências científicas.
O próprio Departamento de Justiça Americano, que concedeu subsídios federais ao DARE, ordenou que um relatório em larga escala fosse conduzido pelo Research Triangle Institute, a mais prestigiada organização de pesquisa do gênero. Depois de analisar grandes quantidades de dados que mostraram que o DARE simplesmente não funcionava, o DARE realmente recorreu a uma ação legal na tentativa de silenciar o relatório. A relutância do DARE em incorporar dados para adaptar seu currículo é sem dúvida uma das razões pelas quais o programa DARE falhou…
Como, então, proteger os nossos filhos e entes queridos contra o uso das substâncias psicoativas ? Neste site Vya Estelar, tenho já escrito diversas vezes sobre algumas evidências científicas de efetividade de algumas ações.
Fatores de proteção contra a experimentação de drogas
Precisamos, primeiramente, apontar os principais fatores de proteção contra a experimentação e também contra a manutenção do uso de substâncias psicoativas.
Os principais fatores de proteção citados nos gêneros textuais científicos podem ser sumarizados abaixo:
a) fortes e positivas conexões familiares;
b) monitoração dos comportamentos dos filhos e amigos;
c) ter regras claras dentro do ambiente familiar a respeito do consumo de substâncias;
d) envolvimento ativo dos pais e cuidadores na vida dos jovens;
e) fortes conexões positivas entre os adolescentes e instituições, como a escola e as instituições religiosas;
f) desenvolvimento e fortalecimento das habilidades do adolescente em lidar com situações adversas.
Embora os fatores citados sejam notavelmente importantes na proteção contra o uso de substâncias, deve-se levar em conta os aspectos da própria personalidade do jovem. Resiliência, persistência, autotranscendência, ser cooperativo, ter direcionamento são alguns fatores de temperamento e caráter associados com a inibição do uso de substâncias. Também, positiva autoestima e boa autorregulação tendem a proteger o jovem contra o consumo de substâncias.
Contrariamente, alguns estudos têm enfatizado que a influência de pares tende a ser muito mais forte do que a influência dos pais sobre o uso de substâncias por um jovem. Parece, realmente, que a influência dos pais modera o fator “influência dos pares”. Isso significa que quanto mais saudável for o relacionamento com os pais, a convivência entre os pais, a salubridade do ambiente intrafamiliar, menor será a influência real dos pares, apesar da sua força inquestionável.
O silêncio no ambiente doméstico a respeito do uso de substâncias não é recomendado, tendo em vista que é impossível deixar de, pelo menos, ouvir falar a respeito delas tanto através da mídia quanto através dos pares.
É preciso ter cuidado quando consultar o Dr. Google!!! Atenção ao que vale a pena ser lido e avaliado como correto ou minimamente confiável!!! Boa sorte!!!